quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Electro-White-Trash-tronics

Sci Fi Industries: "Drafts and Crafts" (Thisco + CM Almada; 2007)
Mimetic Collective: "One by one" (Urgence Disk; 2006)
Umbigu: "Anatomia electrónica" (Skud & Smarty ; 2006?)

A música electrónica - ou aquela música que veio directamente do Techno e do Hip-Hop - tornou-se uma revolução criativa pelo mundo fora. Sem saber tocar uma única nota os "DJ's" ou os produtores podem recriar sons pre-existentes ou criar novos via software/hardware e misturá-los até compor... Música. Tal a simplicidade de operação e a acessibilidade tecnológica (ao príncipio com alguma aparelhagem, actualmente com qualquer PC) teve como consequência uma explosão de novos criadores e claro de novos conceitos e novos universos. Até em Portugal, já se comemoram carreiras de uma década, como a da Useless Poorductions ou do Sci Fi Industries que agora edita o seu quarto trabalho em jeito de aniversário mais uma vez via Thisco, uma das mais importantes editoras de música electrónica nacional. Trata-se de um disco fragmentado entre novos temas e temas remisturados por outros: Xotox, shhh..., [f.e.v.e.r.], Ah Cama-Sotz, Mimetic, Mikroben Krieg, Flint Glass e Structura. Nem sempre coerente (não seria necessário) e nem sempre linear (também não seria necessário) os resultados vão variando de intensidade e de energia, chegando ao ponto de alguma saturação - quem continua a encher os 80 minutos vagos dessa tecnologia redonda chamada CD arrisca-se a ouvir destas. E já agora, quem não arrisca num bom grafismo...
Quanto ao Mimetic que fez uma excelente remistura no CD de Sci Fi, em "One by one" compila uma série de remisturas que fez para Column One, Ah Cama-Sotz, Von Magnet (tema que tinha sido já editado num EP da banda), Ab Ovo, Dither, entre mais 10 projectos electrónicos mais ou menos Darktronics e Industrialitas... Ao contrário, do disco de Sci Fi com o qual também partilha "incoerência" e falta de linearidade (serpenteia no Techno, EBM, Electro-flamengo, Ambient entre outros estilos) consegue ter um som mais vivo. [um exemplar deste disco encontra-se à venda na CCC]
Por fim, Umbigu estreia-se com Anatomia electrónica, um álbum inofensivo como o próprio nome do projecto. Calmo e Muzak como se fosse uma banda sonora para um bar da moda feng shui só tem um momento de quebra em Cérebro Analógico devido à voz neo-romântica decadentista do Adolfo Luxúria Canibal. Umbigu vem na linha estranha da "estética do soar bem e bonito" com a qual não tenho quase nenhuma identificação ou empatia. Não perecebo esta tradição pirosa europeia de "Beleza Sonora" que se confunde com o Etéreo, o Harmonioso, o Melódico e o Funcional - como alías acho que tem sido sobrevalorizado os recentes sons da Islândia ou como foram os da Áustria nos anos 90.
Aliás, todos os projectos que aqui se falam sofrem da evasão à entidade mestiça que é a Europa do século XXI, para mim, "cabrito" de linhagem faz-me confusão toda esta "branquitude" num espaço criativo que permite ir mais longe do que electrificar as ovelhas (thank you, PKD) ou glamorisar o betão europeu. Longe de mim, impingir seja o que for a estes músicos mas entre estes projectos e uns Buraka Som Sistema ou Bong Ra, prefiro os últimos porque já sabemos que os caucasianos são os seres humanos mais chatos do planeta.

sábado, 24 de novembro de 2007

europagraphics ii

Moving Plastic Castles
Sketchbooks, vol. 2: Stand alone and smile ; vol.3: Concrete Floor
(Boing Being; 2006-07) de Tommi Musturi
Kuti #1/5
Uusi Pulmis
(Kuti Kuti; Set'06-Set'07)

Por alguma razão misteriosa, os finlandeses estão a descobrir o "ácido" na bd e ilustração. Fora do já conhecido desengonçado crumbiano ou da crueza non-sense ratada de Panter, os finlandeses andam a borrar cores a torto e a direito nos seus desenhos.
Prova concreta disso é o jornal Kuti editado pelo atelier Kuti Kuti, onde seja qual for o estilo gráfico das bd's a dada altura o que se vai destacar são as cores berrantes aplicadas ora com as canetas de feltro mais básicas até ao Photoshop. Outro ponto comum entre vários autores finlandeses (ou os artistas do atelier Kuti Kuti) é o imaginário sacado aos universos Pop da infância em que são revistos sob um prisma da decadência: ODNI (objectos Disney não identificados), Masters of the Universe desconstruídos, distorções da bonecada fosse ela vindo do brinquedo de plástico ou da bd impressa ou desenhos animados. O último número mudou o rumo exclusivo da bd nas folhas do jornal e começaram a aparecer alguns artigos e entrevistas... Sim, letras e texto - desilusão dirão, mas não projecto está ainda melhor mostrando que a bd finlandesa continua com a força toda.
Musturi (que faz parte desse atelier) tem publicado sketchbooks, o segundo, Stand Alone and Smile está rendido à arte psicadélica - a lembrar até o Moebius mas sobretudo à arte tripada dos anos 60. O mais recente, Concrete Floor, aumentou para o formato A4 e as páginas estão todas verdes - o melhor é tomar alguma coisa antes de fohear o manicómio visual que se apresenta. Há ainda mais um livrinho quadrado daquele que é o resultado (em imagens) de um sonho sobre "Moving Plastic Castles". Mais confusão mental marcado a cores fortes e forte componente iconoclasta.
Por fim, Uusi Pulmis é um mini-zine A6 de lixo do atelier, ou seja, feito espontâneamente de desenhos rejeitados e deitados para o lixo, recuperados pelo gozo apenas de fazer uma experiência "zinista". O lixo de uns é o luxo de outros? A ideia de reciclagem ultrapassa o resultado final, claro está.


à venda na CCC (20% desconto para sócios)

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

3rr0

Coex: "Moving" (Marvellous Tone; 2007)

Não pára a Marvellous Tone! Este ano vai na sua terceira edição e já podemos posicionar esta editora DIY portuense de música electrónica, num saco. Mas não é um asséptico saco de plástico mas num simpático saco de "urban craft". A MT edita CD-R's em edição limitada, embalados em simples caixas de cartão sempre serigrafadas, o que valoriza imenso o objecto sobre o ponto de vista gráfico. A música electrónica que promove é contemporânea, seja na perspectiva funcional (na tradição de DJing), seja na experimental (Dino Felipe) - até havendo várias vezes situações que as duas perspectivas se cruzam. A sensação de vivermos em tempos de reciclagem parece ser a base estética desta editora, que pega em dejectos digitais praticando IDM e breakbeat.
Coex não foge à regra do catálogo MT, começa de uma forma funcional de breakbeats furiosos & fragmentados, muda-se para interlúdio ambiental, salta para um pop feminino freak (será uma colaboração do Projecto Gentileza?), volta aos beats & bytes de uma discoteca espacial, continua em Hip Hop disfuncional, drum'n'bass microscópico e termina banda sonora de serial-killer. Tudo isto em trinta minutos.

PS - o que raios aconteceu à capa deste disco? Porque raios inverteram e mutilaram a ilustração dos aliens?

PPS - entretanto arrabjei os créditos pelo editor: "coex é Joao Alves (desenhou capa deste e do Dino Felipe is sleeping) e Pedro Moura (aka trestristestigres); ficou decidido nao botar nome das faixas, por razoes razoaveis; e na verdade nao se trata de uma colaboraçao com Projecto Gentileza, mas de Ana Deus (igualmente aka 3tt). (...) ah, resta ainda dizer que foi masterizado pelo senhor Quico Serrano."

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Música para Antropomorfos

Fábio Zimbres
Monstro + Voodoo; 2006

A ideia de juntar dois produtos culturais num só projecto não é nova. Nem quando esses produtos são um livro de bd e um disco de rock - e como chama atenção as editoras envolvidas, juntar duas das formas culturais mais populares do século XX que são marginalizadas pela "Alta Cultura" como é a bd e o rock. O que é curioso nesta edição, foi o desenvolvimento do trabalho entre duas entidades sobre uma mesma raiz - ou será antes raízes? Os Mechanics fizeram uma base instrumental, o autor Fábio Zimbres criou conceitos, um universo para eles e depois cada um foi para o seu lado: Zimbres fez bd's (com títulos), os Mechanics criaram as letras (em inglês), títulos para as músicas (que não coincidem com os títulos das bd's!) e finalizaram as gravações.
As bd's de Fábio Zimbres são a selvagaria de sempre graças ao seu traço da tradição "ratty" de Gary Panther ou dos "esquadrões da morte" Fort Thunder. Os traços soltos e "errados" não são menos coerentes com as histórias bizarras, aparentemente desconexas entre si. Na realidade as estranhas bd's estão ligadas e são capítulos, sendo Música para Antropomorfos um livro completo e não uma antologia de histórias soltas como uma primeira aproximação ao livro poderá dar a entender. A(s) história(s) incluem golpes palacianos e a porca da política, cidades-robots em conflito, sátira ao mundo da cultura e da edição. Mais não se pode dizer...

domingo, 18 de novembro de 2007

Glömp #7

Boing Being; 2005

Antologia finlandesa (mas com apenas um autor finlandês desta vez) que edita o melhor que se faz de bd no Ocidente pelas novas gerações gráfico-narrativas.
Os nomes não enganam: Tom Gauld, Helge Reumann (o Elvis Studio no Salão Lisboa 2005), Till D. Thomas (na última CriCa), Giacomo Nanni (Canicola), Fréderic Poincelet, ... e ainda bd's inéditas de Isabel Carvalho e Pedro Nora!!! Mais não é preciso escrever, creio.
A impressão do miolo é feita a cores diferentes de caderno a caderno mas sempre a uma cor (azul, verde,etc...).
Um bom livro!
Está escrito em finlandês mas tem legendas em inglês no fim de cada prancha.

sábado, 17 de novembro de 2007

25 Disegni

Squaz / Paper Resistance
Donna Bavosa + Inguine + Modo Infoshop; 2005

Três entidades uniram esforços para publicar um livro que junta dois ilustradores em cada um deles tem direito a 25 desenhos. A ideia original é da Donna Bavosa (que edita também discos), a Inguine deve surgir porque o Paper Resistance faz parte da casa e a Modo Infoshop é... uma loja! O que deve ajudar imenso a escoar o produto.
Quem for ao site da Donna Bavosa (ou da Modo, já agora) encontrará mais uns dois livros com este conceito de split com 25 desenhos para cada autor.
É uma edição ao mesmo tempo simples de apresentação mas com uma apresentação sólida: papel de boa gramagem, sobrecapa, bem impresso... e claro os trabalhos destes autores são algo muito difícil ignorar.
Squaz lembra Burns e Blanquet - ou ainda o suiço Baladi, recentemente editado em Portugal - talvez seja um tipo de desenho um bocado batido em alguns meandros alternativos. Ainda assim resulta e tem força dadas as temáticas esotéricas-bizarras.
Paper Resistance é um iconoclasta (o Papa com uma metralhadora, um robot saído de um filme Anime no meio de um ritual tradicional japonês, um piloto de aviões com um colete cheio de explosivos) com a escola Situacionista e Punk bem aprendida. O desenho dele é bastante limpo - como se pode ver pela capa aqui ao lado.

à venda na CCC (20% desconto para associados)

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

A marcha portuense da Laica, primeiro movimento

Cartaz de Nuno de Sousa

Todas as manhãs meteorologistas proverbiais aproveitam o horário nobre do seu tempo de antena para divulgar previsões rigorosamente calculadas: Céu pouco nublado ou limpo em todo território, probabilidade de formação de neblinas ou nevoeiros matinais… Dia sim, dia sim. O povo suspira e encolhe-se enquanto aquece as mãos numa chávena de café. Sai-se para a rua. Tarde de chuva, a Península inteira a chorar.Entretanto… Artistas e operários gráficos aproveitam a ressaca do verão de S. Martinho para fazer arrumações na casa. Caprichos domésticos raros de testemunhar aos quais adicionaram algumas gotas concentradas de êxtase colectivo. Desta conjugação invulgar de circunstâncias resultou uma exposição compartilhada do melhor e do pior que têm desenvolvido nas áreas das Artes Plásticas, Ilustração e Banda-Desenhada. Algumas migalhas do quotidiano e a mesma alarvidade boémia de meia tigela, travestida de discurso contestatário que vem fidelizando públicos de norte a sul de Portugal. Filhos de uma mãe com bom gosto, prometem invadir o espaço do Maus-Hábitos e abrir o livro para as crónicas do costume, as comichões de rotina e os bate-pé paraolímpicos que povoam a cultura subterrânea e fazem o gosto popular. - Texto de Miguel Carneiro

«Se cá nevasse fazia-se cá ski»
Exposição de artes gráficas integrada na Feira Laica no Porto
De 15 de Novembro a 23 de Dezembro
Maus Hábitos
Rua Passos Manuel, 178, 4
Porto

Trabalhos de Marco Mendes, Miguel Carneiro, José Feitor, André Lemos, João Maio Pinto, Nuno de Sousa, Carlos Pinheiro, Ana Torrie, Janus, Zé Cardoso, Mauro Cerqueira, Filipe Abranches, Rosa Baptista, Jucifer e Lucas Almeida.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

A Brasileira com Cem

No dia dez de Novembro, pelas dezoito horas, no café A Brasileira em Braga, será apresentado o fanzine “A Brasileira com Cem”.

Com o propósito da comemoração do centenário da Brasileira, um grupo de frequentadores do café, tomou a iniciativa de lhe prestar um tributo, de uma forma alternativa e mais genuína. O desafio consistiu em realizar um trabalho até duas páginas, que poderia ser em forma de texto(s), fotografia(s), desenho(s), banda desenhada, etc., sobre o que a Brasileira representava para cada um, tendo como objectivo compor um possível retrato do café, pela altura do seu centésimo aniversário.
A resposta surgiu através de vinte e cinco trabalhos originais e heterogéneos, que são agora apresentados em formato de fanzine colectivo. Testemunho de uma forma peculiar de sentir a Brasileira, que ultrapassa a normal relação existente, num qualquer espaço comercial.

A preceder a apresentação do fanzine, está prevista a colaboração do Sindicato da Poesia, com a leitura de textos alusivos a cafés.
(ilustração "O melhor café é o da Araci..." de Helena Carneiro)

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Beja poetry comics crew

Já lá foram alguns meses desde a terceira edição do (actual) melhor festival de bd português, o de Beja, e claro que agora todos andam com o pito aos saltos com as inesperadas novidades editorais que estão a sair na BD Porcalhota, mas a vida não dá para tudo, e só agora consegui divulgar as edições da Bedeteca de Beja, a saber, os terceiros volumes de Venham +5 (zine) e da colecção Toupeira (comic-book / mini-álbum na tradição da Lx Comics) com La Bellête. Mas mais vale tarde do que nunca.
No primeiro caso, houve uma redução de formato e de páginas, o que favoreceu os trabalhos (quanto maior o formato mais expostas ficam as deficiências gráficas) embora neste número a qualidade geral das bd's publicadas tenha subido. Aparecem alguns convidados, resultado da actividade do festival, como Pedro Rocha Nogueira e o espanhol Fritz. A revista encontra-se num ponto novo de partida, compromisso de promover os talentos locais e de editar bd de autores mais coesos. A poesia reina por estas páginas e pelos vistos os portugueses adoram poesia ao ponto que a Porcalhota deu um "Pacóvio& Grilinho" (Melhor Zine 2007).
Tal como reina em La Bellête, segundo livro de Pedro Rocha Nogueira - o primeiro tinha sido o Lx Comics, Dumb Angel (dumb me). Do primeiro para o segundo o autor refina o grafismo, aumentando-lhe a complexidade do traço, mais texturas e mais contrastes. O texto continua hermético e quase que cosmogónico mas sente-se melhorias imensas - realmente a Lx Comics servia a sua funçaõ de "primeiro livro".
[E ontem saíu o novo número do Venham +5, desta vez com colaborações estrangeiras de Alain Corbel, Alex Uyeno e Kike Benloch. É capaz de ser o melhor número deste zine e é de destacar a bd de Carlos Páscoa!]

sábado, 3 de novembro de 2007

O projecto de fecundar a lua #1

Auto-edição; Jul'07

É difícil encontrar bd mais secreta e sem defesas do que estas de Janus e Marco Mendes. Não apenas por se tratar de uma obra fora dos circuitos, sistemas, rotinas, escolas, etc, mas principalmente porque ela não parece existir na aproximação a nenhum pensamento conhecido nem dá mostras de se render a qualquer dos habituais discursos com efes e erres e pontos nos is para sobreviver ou sentir-se sustentada. O que a segura é, dá ideia, outra coisa completamente diferente. A sua pura vontade, desejo ou loucura - esse seu imperfeito, inconveniente e tão esquisito porque-sim.
Bd's no reverso de caixas de cartão, embalagens, pedaços rasgados, o avesso do lixo. Porquê? Porque "a vida está cara", porque era o que estava "mais à mão", porque sim. Esta é uma bd negra, negra, negra, em que a ingenuidade de bonecos com bocas grandes (bidimensionais e vagamente totémicos) se mistura com a violência dos mais poderosos fantasmas do sexo e da morte. Uma bd de dualidades e oposições - positivo e negativo, frente e verso, fíguração e não -que não é nada óbvia ou "binária" no tempo do seu olhar. Pelo contrário, atravessa-a uma duração fluida e espessa que lembra o tempo dos pesadelos. Nas bd's de Janus e Marco Mendes há só o corpo do erotismo e o corpo do terror - nela a vida reduz-se, amplifícada, a isso, recusando tudo o resto. Os outros, as palavras. A ilusão, a tralha sentimental.
Mas isto, se é possível (e é: é esse o espanto!), no modo leve e cheio de graça desta arte-porque-sim.

[ehm, como não me apetecia escrever, saquei um texto de um catálogo de pintura com um texto de um escritor qualquer famoso, substitui pintura por bd e o nome do pintor pelos do Janus e Marco Mendes... não que faça muito sentido mas que se lixe! O zine é fixe porque-sim ao contrário do texto e a pintura dos outros que eram uma bela merda. Pedidos devem ser feitos aos gajos d'A Mula enquanto o Mendes não enviar uns exemplares para vender na CCC]