terça-feira, 28 de novembro de 2017

Novas leituras cosmopolitas

Lisboa e gentrificação? Que cliché! Já se pode falar é mas é de "brasilificação". Cidade dos ricos e cidade dos pobres, a classe média que vá para o raio que a parta! Enquanto isso acontece, o que não faltam são eventos underground e visitas internacionais de ícones da Cultura alternativa como o engraçadinho do Momus (Zaratan) ou dos barulhentos Melt Banana (ZDB). Mais interessante, quanto mim, são os outros doidinhos menos conhecidos, como o neo-zelandês Ron Gallipoli ou o francês Etienne Brunet, que além de músicos mantêm uma actividade literária quase saudável, quase...

Black Lantern : Journal of Tropical-Industrial Art, vol. 2 (Matadouro; 2017) é uma espécie de Antibothis versão fanzine sobre o tema do "Tropical-Industrial". Objecto fragmentado de vários artigos consagrados a essa corrente cultural dos nossos antípodas, que não é muito diferente das ideias já geradas do Post-Punk, Industrial ou Plunderphonics, ou seja, submergir no lixo cultural e desse caos criar alguma ordem artística. Os manifestos e textos que aparecem neste "jornal" são mais poéticos do que funcionais, com algum cheiro de anti-política e a descoberta quase juvenil de uma ética pessoal. Gallipoli é o instigador deste movimento com a ajuda de Colin-Israel Fulgar e outros artistas. A seguir a ascensão e queda desta estética!




Acouphènes Parade (2012) e Parigot (2016) pela Longue Trïne Roll são dois livros modestos em formato e forma mas cheios de raiva e energia de um saxofonista que escreve como se fosse "sex, drugs & rock'nroll", embora o tom seja mais geriátrico, do tipo "transex, copofonia & free jazz". São relatos de sobrevivência para quem a vida lhe corre tudo mal: sofre de tinido - desculpem o mau gosto para este link -, perde o Amor, é difícil arranjar trabalho (quem é que quer ouvir um músico de Free? ainda por cima semi-surdo?) e o mundo que conhece desmorona-se a olhos vistos - sendo parisiense vive de perto os massacres na Charlie Hebdo e no Bataclan. Ao contrário de um "teenager" que provavelmente se suicidaria com tantos infortúnios, Brunet enfrenta o boi pelos cornos, c'est la vie, até porque há mesmo vida depois de explosões seja num ouvido seja num bar. Ainda é possível boémia mesmo sobre um estado policial, pelos vistos. A escrita dele é tão pot-pouri como as suas músicas. Se o Free é o início para Brunet, ele é um músico curioso e que se interessa por várias outras formas - Glitch, Techno, Rock, músicas de África, Ásia ou Balcãs - basta consultar a sua discografia para perceber isso. Na escrita é tão evidente esse seu espírito irrequieto pois escreve crónicas autobiográficas ou ensaios autoficcionados e não vai de modos, acopla ainda poesia visual ou partituras semi-funcionais. Ele que venha mais vezes a Lisboa e que traga destas prosas cortantes.

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