quarta-feira, 31 de março de 2010

punk que é punk não grava!

Geralmente bandas Punk mesmo que mediocres costumam resultar bem ao vivo, o problema é quando gravam em estúdio o "power" desaparece. O que não é bem verdade, para além das excepções seminais, por acaso em Portugal nos anos 80 e príncipios de 90 quem melhor gravou os melhores discos com qualidade de som foram as bandas punk (Peste & Sida, Censurados e Mata-Ratos) versus bandas super-originais mas que em disco tinham produções horríveis, como os Lucretia Divina, por exemplo.
Nos últimos meses, sabe-se lá porquê, fui acumulando discos de Punk / Hardcore ad nauseam, género que deixei de ouvir há muitos anos por achar que para além de estarem mortos criativamente (e estão) são fechados em si mesmos (e são), nutrem uma atitude hipócrita de aclamarem abertura e liberdade mas ignoram as bases oferecidas pelos Clash (mestiçagem e cosmopolitismo) e pelos Crass (experimentação). Para tanto discurso anti-racista e anti-imperialista é incrível que o punk-rock ainda seja só velocidade (Ramones) e distorção (Sex Pistols).

Tocaram no lançamento do novo álbum dos Albert Fish, e os putos-mesmo-com-mesmo-cara-de-putos holandeses This Routine Is Hell ganharam a... tarde - o concerto foi na Casa de Lafões (tipo Sociedade Recreativa decadente em que os punks e hardcores tem usado quase todas as tarde de fim-de-semana para organizar concertos no melhor estilo matinê). E se ao vivo incendiaram a casa, no disco The Verve Crusade (Shield; 2009) aguentam-se bem no lado A (sim é um vinil! e vermelho!) e vão perdendo pica para o lado B - é mentira!!! Eu é que vou perdendo a pica de ouví-los, porque não gosto de Hardcore seja como for! Lembra Rollins Band pelo arranca-e-pára e mudança de ritmos, e pela forma explosiva como as letras são berradas de forma emotiva e com presença "física". De certa forma ao ouvir o disco parece que ainda estou a ver o vocalista ao vivo.

E não há Hardcore sem os D.O.A. nem por que seja porque foram eles que cunharam o género com um álbum de 1981. Ouvindo War and Peace (Red Star 77; 2003) que reúne temas de 1978 até 2001, percebe-se o que vai separar o Punk inicial dos anos 70 (com uma raiz Rock acrescentada de um atitude feroz) do Hardcore (que pega no Punk e acelera ainda mais o ritmo e torna tudo mais agressivo: guitarras, letras, voz,...), em que os D.O.A. estiveram dos dois lados, um tema Disco Sucks (1978) é pura parvoíce teenage punk enquanto que um tema como World War 3 (1980) já exibe outro tipo de preocupações nas letras e potência no som. Mas sobretudo o Hardcore é mais que uma segunda geração de Punks mais selvagens, é uma geração que passa a usar o DIY como arma (fotocópias, zines, singles baratos também com capas fotocopiadas, concertos auto-organizados, auto-edição, etc...), e a ter uma postura política radical - realmente anarquista (sobretudo na Europa), de esquerda-radical ou até moralista (o movimento straight-edge). Os D.O.A. são são uma instituição viva que neste disco comemoraram 25 anos de existência, em que realmente dentro de um cenário Hardcore ouve-se um bocado de tudo, a cena rápida, o uso de Reggae numa ou noutra faixa (War in the East, Death to the Multinationals), a versão manhosa (War de 1969, aqui gravada em 1982, três anos de Bruce Springsteen torná-la quase "sua"), a loucura da participação com outro mito do Hardcore, Jello Biafra (do álbum Last Scream of the Missing Neighbors, 1989), a onda poppy com Ska (Overtime) e ainda algumas "sing-a-longs" anti-globalização ingénuas como Just say no to the WTO (2001). A energia existe em qualquer dos "tipos" referidos não fosse esta uma banda canadiana - juro que existe algo de estranho com as "bandas pesadas" daquele canto do planeta.

Voltando aos Albert Fish, no final do ano lançaram o novo álbum News from the Front (Your Poison + Raging Planet + Zerowork + Graver + Criminal Attack; 2009) que apesar das artimanhas orelhudas de Hardcore melódico (mas sem ser o de praia) cheio de "oh, oh, oh" até arrepia porque tem a velocidade e energia para convencer. Bom disco de Punk Template depois do Punk já ser MTV à escala global, tudo é certinho e tudo bem tocado que até se perdoa a falta de ousadia de querer esticar os limites. Ao ponto que o único defeito a apontar é a voz que se percebe que é inglês batata frita. Nunca pensei que poderia vir a gostar disto... é o que faz ter perdido os discos dos Offspring nos anos 90...
(esta é a primeira versão da capa do disco mais gira que a final - por acaso encontrei na 'net e achei mais porreira de se publicar para ver se Punk aprende)

Os Intervenzione já acabaram (1995-2005) mas ainda assim foi editado Last screams (Rebeldes Vagabundos do Haxixe; 2009) com gravações perdidas de uma banda que circulava num Hardcore típico dos anos 90, politizado e militante, com uma voz feminina que bem berrava - Lena era o seu nome e será das primeiras vocalistas de bandas pesadas?
Algumas letras roçam o inglês ingénuo (Free Tibet), outras o português ingénuo (só duas) com um impacto bem maior para quem é português. Basta ouvir TVI sai do ar (mesmo que seja uma "ripada-homenagem" ao tema MTV get off the air dos Dead Kennedys) para sentir um impacto bem maior que... Free Tibet? São só 23m de agonia Hardcore, suporta-se bem. O CD ainda tem vídeos de 1999 da banda ao vivo e que mostram que em tempos Lisboa já foi uma cidade com casas okupadas - bons velhos tempos!!!

Agonia à sério são os italianos Kalashnikov - qualquer dos seus álbuns (todos eles disponíveis para descarga) embora tenha começado pelo Dreams of Super-Defeated-Heroes (2007). São um grupo de Milão super-militante do DIY, tanto que os todos os seus discos (incluíndo os "projectos paralelos") podem ser descarregados, não só os ficheiros mp3 mas também as capas, letras, etc...
Os discos físicos vive de uma rede de editoras ou organizações similares que apoiam essa materialização física dos discos, talvez por isso que encontrei um exemplar através da Infected Records, que comprei logo dado ao atraente grafismo da edição e a colagem de imagens do Homem-Aranha (dos anos 70 - e já agora em italiano: Uomo-Ragno!) com imagens de "riots" (provavelmente também dos quentes anos 70 em Itália). Uma banhada caucasiana total que mais parece um disco de Power Metal com uma voz feminina terrível. De punk só se for a atitude DIY e as letras políticas. Outros que não perceberam os Clash nem os Crass...

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