sexta-feira, 30 de março de 2012
quarta-feira, 28 de março de 2012
Kristiina Kolehmainen (1956–2012)
foto tirada no Festival de Helsínquia 2006
Faleceu ontem, vítima de cancro, Kristiina Kolehmainen, fundadora e directora da Bedeteca de Estocolmo.
Mulher de armas, bem que instigou os suecos do seu conforto e calmaria para a banda desenhada, ora com a manutenção de uma excelente biblioteca de BD no centro da capital, ora organizando um relaxado festival de edição independente, o SPX de Estocolmo, onde convidava autores ou outros agentes de referência mundial na BD. Por lá visitaram como convidados da organização os portugueses Luís Lázaro (que teve direito a uma exposição), Marcos Farrajota (na imagem), Rosa Barreto (da Bedeteca de Lisboa) e a Jucifer.
De origem finlandesa, Kristiina dizia que os suecos tinham os polegares enfiados no rabo, e provava isso todos os dias com a sua alegria, capacidade de comunicação com o exterior e vontade de agir contra a timidez sueca, o snobismo de Estocolmo e a burocracia das instituições públicas - quem pensa que só em Portugal existe tal coisa, engane-se... Nos últimos anos a Bedeteca de Estocolmo mudou de sítio, para desagrado de Kolehmainen, no interior do edifício da Kulturhuset (Casa da Cultura). Dada a forma lenta e burocrática que funciona a Kulturhuset, para além de não entender o meio da BD e das suas potencialidades, esperamos que o seu falecimento não signifique o fim da Bedeteca nem da SPX para gaúdio dos burocratas e outros parvalhões.
Conheci-a num Festival de Angoulême, apresentada pelo Igor Prassel (então da Stripburger), e rapidamente tornamo-nos amigos devido ao seu humor e pouco vontade de entreter os idiotas da BD. Kristiina, tal como muitas mulheres ligadas à BD, não tinha as mesmas referências da cultura "nerd" e "bedófila" que a BD é infestada, por isso sempre teve um posicionamento adulto, contemporâneo e artístico em relação à BD que divulgava.
Soube hoje desta triste notícia através de um amigo comum sueco. A última vez que estive com ela foi em Setembro do ano passado, na Finlândia, num divertido fim-de-semana que incluiu a visita ao ITE. Supreendeu-me quando disse que na "sua" Bedeteca tinha feito assinatura da Raw Vision porque achava que a BD e a "arte bruta" tinham enormes relações. Estava sempre um passo ou dois à frente! Foi-se uma amiga e uma lutadora contra a estupidez no mundo da BD.
Faleceu ontem, vítima de cancro, Kristiina Kolehmainen, fundadora e directora da Bedeteca de Estocolmo.
Mulher de armas, bem que instigou os suecos do seu conforto e calmaria para a banda desenhada, ora com a manutenção de uma excelente biblioteca de BD no centro da capital, ora organizando um relaxado festival de edição independente, o SPX de Estocolmo, onde convidava autores ou outros agentes de referência mundial na BD. Por lá visitaram como convidados da organização os portugueses Luís Lázaro (que teve direito a uma exposição), Marcos Farrajota (na imagem), Rosa Barreto (da Bedeteca de Lisboa) e a Jucifer.
De origem finlandesa, Kristiina dizia que os suecos tinham os polegares enfiados no rabo, e provava isso todos os dias com a sua alegria, capacidade de comunicação com o exterior e vontade de agir contra a timidez sueca, o snobismo de Estocolmo e a burocracia das instituições públicas - quem pensa que só em Portugal existe tal coisa, engane-se... Nos últimos anos a Bedeteca de Estocolmo mudou de sítio, para desagrado de Kolehmainen, no interior do edifício da Kulturhuset (Casa da Cultura). Dada a forma lenta e burocrática que funciona a Kulturhuset, para além de não entender o meio da BD e das suas potencialidades, esperamos que o seu falecimento não signifique o fim da Bedeteca nem da SPX para gaúdio dos burocratas e outros parvalhões.
Conheci-a num Festival de Angoulême, apresentada pelo Igor Prassel (então da Stripburger), e rapidamente tornamo-nos amigos devido ao seu humor e pouco vontade de entreter os idiotas da BD. Kristiina, tal como muitas mulheres ligadas à BD, não tinha as mesmas referências da cultura "nerd" e "bedófila" que a BD é infestada, por isso sempre teve um posicionamento adulto, contemporâneo e artístico em relação à BD que divulgava.
Soube hoje desta triste notícia através de um amigo comum sueco. A última vez que estive com ela foi em Setembro do ano passado, na Finlândia, num divertido fim-de-semana que incluiu a visita ao ITE. Supreendeu-me quando disse que na "sua" Bedeteca tinha feito assinatura da Raw Vision porque achava que a BD e a "arte bruta" tinham enormes relações. Estava sempre um passo ou dois à frente! Foi-se uma amiga e uma lutadora contra a estupidez no mundo da BD.
terça-feira, 27 de março de 2012
segunda-feira, 26 de março de 2012
A gata Deus aprova este Silk Combo...
Este fim-de-semana no atelier Mike Goes West começaram a sair as primeiras serigrafias que estarão expostas no lançamento do Bestiário Ilustríssimo. As ilustrações do livro foram realizadas por Joana Pires, sendo que os desenhos para serigrafia tiveram montagens diferentes e foram adicionadas cores.
Recordamos que o lançamento do livro e a exposição deste material será no dia 17 de Abril, às 21h30 na Trem Azul.
...
Esta é a segunda vez que a Chili Com Carne investe neste tipo de impressão, dado ao acontecido decidimos abrir uma secção de serigrafias na nossa "shop online".
Porque não acontece apenas aos outros...
Pedro Sousa, músico e sócio da Chili Com Carne (participou na banda sonora do Futuro Primitivo), foi uma das vítimas da agressão policial de Quinta-Feira passada. Mais sobre o assunto consultem o texto de Rui Eduardo Paes no Bitáites, ao qual subscrevemos inteiramente.
...
Adenda: também Jorge Parras, autor espanhol que participou no Boring Europa, foi agredido nos motins de Valência - só porque estava no sítio errado à hora errada. Estes motins aconteceram porque a polícia montou carga sobre estudantes do secundário que se manifestavam contra as péssimas condições das escolas públicas. A polícia espanhola ainda teve a lata de dizer publicamente que não declarava nada mais para não dar informações ao "inimigo" - e para quem não percebeu, o "inimigo" somo nós, o povo... A "Naziropa" está aí...
sábado, 24 de março de 2012
Que a Bolha não rebente...
A Bolha é uma loja de Rio Janeiro e uma editora de poesia e banda desenhada. Uma frase destas simplifica todo um enorme projecto dirigido por Rachel Gontijo que abriu uma loja de BD e outros grafismos num terraço de um prédio. E para complicar ainda deciciu editar poesia contemporânea norte-americana no Brasil, para além de livros de BD. Deve ser louca! Mas, muito provavelmente, alguém o tinha de fazer...
A selecção dos livros de BD é no mínimo peculiar e revela uma editora atenta às movimentações da BD pelo globo fora. Na primeira fornada de livros vamos encontrar séries norte-americanas como 0-800-Ratos #1, um comic-book serializado de Matthew Thurber, entretanto já concluído e compilado pela Picturebox. A história mete "ratos-telegramas", punks, psicadelismo, grupos ecológicos radicais, tramas políticos,... feito num estilo livre mas virtuoso para quem fuma charros todos os dias. A coisa têm piada ao início, depois torna-se uma confusão narrativa e as personagens não nos absorvem, o que da dada altura dá pouca pica para ler, como acontece com Richard Sala, por exemplo. Chega um ponto que todas as personagens podem morrer que o que nos iria preocupar era se ainda temos batatas fritas para trincar. Powr Mastrs, vol. 1 de C.F. pode estar nesta categoria também, afinal somos levados para um mundo de "Senhor dos Aneís" digerido com cogumelos mágicos mas a sua narração é mais consistente e o desenho mais naturalista, o que nos faz pensar que ainda podemos vir a gostar da série. A legendação da edição está muito grossa e estraga o grafismo das pranchas. A julgar pelo cuidado do design das edições d'A Bolha, acredito que esse erro (de ínicio de actividade) deverá ser corrigido no anunciado segundo volume.
A Celebração é o primeiro livro de Rui Tenreiro e que finalmente vê uma edição em língua portuguesa. "Filho da Aldeia Global", o autor nasceu em Moçambique, tem nacionalidade portuguesa mas tem vivido na África do Sul, Noruega e Suécia. Foi na Noruega que publicou este livro - Høytiden (Jippi; 2008) - baseado na cultura Shinto, o que justifica um grafismo limpo e uma narrativa circular-karmático. É sobretudo um livro elegante...
Vai para o Diabo do argentino Federico Lamas é daqueles livrinhos de desenho que toda a gente adora por causa da piada do livro ser um 3D menos 2D. Explicando melhor, o livrinho A6 é impresso a duas cores, azul e vermelho, e é acompanhado por apenas uma "lente" vermelha dos clássicos óculos 3D. Invés de fazer a ilusão tridimensional, o "óculo" vermelho esconde a informação vermelha (deixamos de a ver) e ficamos a ver apenas o que está a azul... É aí que vemos um mundo de gente zangada - o termo mesmo é fodida - que nos manda para o Diabo o tempo todo. Hilariante!!! E engenhoso para quem se fartou da moda dos livros em 3D.
Um excelente trabalho do outro lado do Atlântico que também vai editar o Caminhando Com Samuel do finlandês Tommi Musturi. A Bolha tem bom olho!
Falha humana
3x1, de Jano
Sólo Tinta (Polaquia Sketchbook #6), de Alberto Guitián
(Polaqia; 2012)
Não se percebe se a Polaquia morreu ou não - as informações são contraditórias nos sítios consultados... Trata-se de uma associação sem fins lucrativos de autores de bd da Galiza que edita antologias e livros a solo. Mais contráditória quando o simpático Jano, autor já editado no Mesinha de Cabeceira, envia novidades! (então não está defunta, né?)
A primeira é de sua autoria, uma antologia num atraente formato A6 de três séries de tiras humorísticas que não conseguiram ser vendidas para os periódicos. Um fracasso comercial que ao menos serve para fazer uma bizarra capa em que as três personagens das séries, a Morte, um barata e um pugilista mexicano, são fundidas numa só figura... E ficamos por aqui, o humor normalizado, sem rasgos de génio ou inovação estética. Preferia ver o Jano em bds mais pessoais, sem dúvida!
Quanto à segunda novidade, faz-nos levantar a questão: para que serve um livro de esboços? À partida seria para admirar o virtuosismo de um desenhador ou de um artista que tenha uma obra grande e respeitável. Nos últimos anos têm sido antes uma forma fácil de capitalizar trabalho inédito ("esboço" significa ou que significa) para fãs babacas ou para colocar mais um título na bibliografia sem grandes esforços - e repito "esboço" significa ou que significa. Fora do cinismo, alguns casos de livros de esboços são merecidos terem uma edição dada à beleza dos desenhos (esboçados), a algum valor estético ou documental. Não é o caso deste Sólo Tinta que não é que os esboços sejam feios ou que o desenhador não tenha qualidade, ele têm todas as qualidades de um artista comercial de BD e ilustração caricatural e cómica, igual a dezenas de outros autores espanhóis ou franceses ou por exemplo do "nosso" Richard Câmara para enfiar um português no mesmo saco Pop. Creio que teria de ser fã do trabalho deste autor para comprar o seu livro de esboços. Felizmente no mundo da edição independente existe o sistema de trocas de livros da CCC pelos da Polaquia...
sexta-feira, 23 de março de 2012
A ASAE não sabe de nada...
A Lituánia deve ser o sítio que está a dar! Além de artistas psicadélicos e fanzines malditos ainda lhe dá na edição de discos de Jazz / Improv como se poderá constantar pelo disco (em vinil) de RED Trio + John Butcher : Empire (No Business; 2011). Depois do disco homónimo de estreia que foi bem recebido pelos amantes do género, este segundo disco com o saxofone do inglês John Butcher não lhe ficou atrás em qualidade e receptividade. Aliás, o nome do inglês exprime o que se passa por aqui. Momentos suaves de mastigação de carninha mole são abalados por machadadas e cortes variados com outros instrumentos de carnificina. Imagino que se estes tipos fossem mesmo donos de um talho ninguém gostaria de ser o porco ou vaca na loja - em todo o caso, quem gostaria de ser porco ou vaca? Todos sabemos (ou deveriamos saber) que carne vermelha faz mal à saúde mas ninguém nos avisa sobre os efeitos de um disco como este! Tenham cuidado a entrar nele!
quinta-feira, 22 de março de 2012
Excessive Voyeurism #1
Shaltmira; 2012
Da Lituánia apareceu um fanzine de Arte Negra, escatológica e "underground" - o que quer dizer quase tudo a mesma coisa.
Para quem se queixa da falta de tradição em publicações do tipo fanzine até se safou bastante melhor do que se esperaria, tanto pela selecção de artistas publicados quer pelo aspecto físico do objecto. A impressão profissional e brilhante reproduz obras de vários artistas como Marcel Ruitjers, Manuel Pereira, Vctor Dvunkel, Arturas Rozkovas, Zeke Clough entre vários outros da França, Suécia e países de Leste.
Redigido em inglês para a Aldeia Global poder ler, o único ponto negativo são as entrevistas aos artistas que são demasiadas mecânicas, uma vez que as perguntas são as mesmas para todos.
Um verdadeiro fanzine para ímpios que gostam de papel!
quinta-feira, 15 de março de 2012
Infecção Industrial
Foram os Throbbling Gristle, no final dos anos 70 do século passado, que cunharam o termo “Industrial” à nova música realizada por uma geração que gozava de novas formas de tecnologia para criar e difundir música. Estávamos na Era da Informação a poucas décadas da nossa Era Digital. O termo musical relacionava-se com a Revolução Industrial, em que a relação do "homem-músico" com as máquinas iria mudar tal como a partir do século XVIII a vida do Homem mudou para sempre com as primeiras máquinas a vapor.
Apontemos à Revolução Industrial a poluição e ruído, o consumismo frenético, o aumento da área produtiva dos serviços, a não-especialização da mão-de-obra barata versus hiper-especialização de tecnocratas, a urbanização / abandono dos campos, a miséria e explosão demográfica, o aumento da velocidade dos transportes, o capitalismo moderno, a difusão de ideias democráticas e sociais, o nacionalismo e a militarização, etc... Após o Punk e o Industrial - impossíveis de as separar porque partilham o mesmo momento histórico e modelos de produção - iremos encontrar mudanças na música: uso do ruído das máquinas e processos mecânicos (concretos), consumo excessivo facilitado com a oferta de auto-edição e edição independente, produção e disseminação através de tecnologia caseira (o gravador de k7, o estúdio caseiro, o “tape-trading”), aumento de artistas “não-músicos” (sem qualificações académicos ou formação), invenção de instrumentos e o uso de objectos como instrumentos (como o gira-discos), auto-gestão, fetichização por objectos de culto (edições limitadas), segmentação dos públicos (tribos urbanas, subculturas, elitismo), ritmos maquinais (techno), uso de multimédia e performance ao vivo, o sampling, a remix e o mash-up,...
Após a sua origem o “Industrial” vai ser encontrado em quase todos os aspectos da vida cultural. Pode ser encontrado no Hip Hop dos Public Enemy, no Dub de Techno Animal, e claro no Noise de Merzbow. Não seria descabido também dizer que o Industrial institucionalizou-se, pela forma Pop/ Rock – que pretendia destruir – nos milhares de discos vendidos de Ministry, Nine Inch Nails, Marilyn Manson e Rammstein. Pela pista de dança, como EBM, Gabba e Rave até ser transformada em música de carrinhos de choques – é especialmente grave esta facção de pimbas que chamam de Industrial ao Techno Gó-Gó…Pelos espectáculos circenses para massas fascinadas com a precursão de tachos e panelas, vassouras e latas do lixo. E por fim, as velhas bandas seminais ficaram “respeitáveis” e tocam nos dias de hoje em centros culturais de prestígio como Einstürzende Neubauten no Centro Cultural de Belém ou Throbbling Gristle (como X-TG) na Casa da música - aliás, até a razão deste artigo, os Sektor 304 também já tocaram lá.
Para além do que foi descrito nas linhas acima, para que serve o Industrial então? Qual o seu papel actual na música? Qual a sua relevância quando já sofreu mil metamorfoses e osmoses? Foi um movimento de vanguarda que está morto e agora é regurgitado em modelos mais limpos? Camuflou-se no seio do pós-modernismo? Ainda faz sentido vestir fatos de Nazis ou de Sovietes num concerto? Ou mostrar imagens de massacres étnicos ou vivissecção de animais? Terá o Industrial a missão politica de combater os Totalitarismos tal como o Black Metal tem como bandeira o Grande Cabrão ou os Straight-Edge o Veganismo e outros ismos?
Não sei nem creio que os Sektor 304 tenham as respostas para tal. De créditos firmados vão no seu quinto registo em disco, sendo já o segundo a ser lançado pela Malignant, editora norte-americana que é uma referência no pós-Industrial e outros “Darkismos”. A banda foi criada por João Filipe e André Coelho – grande ilustrador que tem participado nas antologias da Chili Com Carne – e passaram a quarteto neste novo disco, Subliminal Actions, com a inclusão de Henriques Fernandes e Gustavo Costa - um Gorbachev na música portuguesa! O som da banda tem sido comparado à génese do Industrial pelo facto de terem contrariado a tendência generalizada de fazer música de forma electrónica e digital. Os Sektor 304 perceberam que existe vida para além dos computadores e foram à raiz analógica desse som inaudível, violento e barbárico dos primeiros tempos de SPK ou Laibach. Podemos ouvir milhares de discos de Noise e Industrial nos dias de hoje mas são poucos os discos que nos marcam porque tal como 90% da produção musical nos dias de hoje, o digital prevalece e apaga os registos orgânicos da gravação – e não é por James Plotkin ter masterizado o disco que há muito tempo não se notava a diferença electro-acústica entre os Sektor 304 e os seus “concorrentes industrialitas” (ou de outros géneros musicais). Não há sinal digital que consiga ultrapassar uma amplificação de uma chapa de metal encontrada na rua a ser torturada com uma serra ou uma lima.
Sektor 304 é um monstro parido do universo de H.P. Lovecraft com a sordidez do desastre de Fukushima. As patadas desta besta sonora vêm do tribalismo rítmico de África – aliás, tudo (música ou não) vêm de lá! Esta associação e influência africana era assumida pelos primeiros músicos de Industrial, ao contrário das novas gerações embasbacadas pelos uniformes dos regimes totalitarismos ou o látex S/M que acham que a música Industrial é “branca”. Há de agradecer aos Sektor 304 nem que seja só por nos recordarem isto, desde 2009 aquando do álbum Soul Cleasing.
A juntar à violência física da besta, ainda somos obrigados a visitar as dimensões fatais de um outro mundo através do psicadelismo dos baixos e dos “noises” tão em voga dos dias de hoje. Há um momento alto no disco para quem não suporta apenas “psico-barulheira” – admito que o disco é longo e pesado - é o tema By the throat, verdadeira festa polirítmica com quatro registos vocais em discussão – em que o gutural Death (cortesia do vocalista dos Genocide) e o vampirizado Black ganham a batalha e são uma lufada de ar fresco para quem está habituado a ouvir o Industrial como algo cristalizado.
Não consigo deixar de relacionar a música Industrial com o que Alan Moore escreveu no prefácio de V for Vendetta, livro publicado no final dos anos 80 mas escrito pelo autor britânico nos inícios dessa década. Escrevia ele que achava as premissas do argumento dessa BD eram ingénuas – fruto da sua jovem idade – como pensar que seria necessário um Inverno Nuclear para que o Fascismo se pudesse instalar. A música Industrial em 1976 alertava do perigo do Fascismo disfarçado de Big Brother no futuro. Trinta anos depois este estilo de música espelha-se de uma forma deformada. Realmente o Fascismo já se instalou, invés de estender “fachos” temos bandeiras (de eventos desportivos, casamentos reais ou visitas do Porco-Mor Católico) nas janelas e varandas, vivemos reprimidos pelo Estado e grandes empresas (em que a vigilância é feita por nós próprios cidadãos censores e bufos), somos alienados por uma cultura hedonista, uma economia poluente em plena colisão entre a sofisticação técnica e a degradação humana. Se o Industrial ou os Sektor 304 têm alguma raison d’être em 2012 é porque simbolizam um “retro-futuro” ou um “Futuro Primitivo” (se me permitirem a “publicidade” a uma antologia de BD organizada por este vosso escriba e que André Coelho também participou) situada entre as maravilhas do mundo digital e o entulho dos excedentes… industriais.
Esta música “industrial” dos Sektor 304 simboliza (mais uma vez) o acidente que está para vir. Se o Apocalipse ainda não apareceu pelo menos já compôs a sua banda sonora. Então, que raios faz esta pérola na periferia da Europa onde ninguém lhes liga? Os gajos deviam era meter-se a caminho de Moscovo num tractor quitado a puxar um atrelado com a a banda em cima a tocar “non-stop”. Esta digressão Porto/ Moscovo devia-se chamar “Born Again Chernobyl” e anunciaria o Apocalipse, sendo a banda os seus Anjos bíblicos anunciadores – sugere-se o uso de Homens-Salsichas disfarçados à Gwar na dianteira do tractor! But I digress…
Apontemos à Revolução Industrial a poluição e ruído, o consumismo frenético, o aumento da área produtiva dos serviços, a não-especialização da mão-de-obra barata versus hiper-especialização de tecnocratas, a urbanização / abandono dos campos, a miséria e explosão demográfica, o aumento da velocidade dos transportes, o capitalismo moderno, a difusão de ideias democráticas e sociais, o nacionalismo e a militarização, etc... Após o Punk e o Industrial - impossíveis de as separar porque partilham o mesmo momento histórico e modelos de produção - iremos encontrar mudanças na música: uso do ruído das máquinas e processos mecânicos (concretos), consumo excessivo facilitado com a oferta de auto-edição e edição independente, produção e disseminação através de tecnologia caseira (o gravador de k7, o estúdio caseiro, o “tape-trading”), aumento de artistas “não-músicos” (sem qualificações académicos ou formação), invenção de instrumentos e o uso de objectos como instrumentos (como o gira-discos), auto-gestão, fetichização por objectos de culto (edições limitadas), segmentação dos públicos (tribos urbanas, subculturas, elitismo), ritmos maquinais (techno), uso de multimédia e performance ao vivo, o sampling, a remix e o mash-up,...
Após a sua origem o “Industrial” vai ser encontrado em quase todos os aspectos da vida cultural. Pode ser encontrado no Hip Hop dos Public Enemy, no Dub de Techno Animal, e claro no Noise de Merzbow. Não seria descabido também dizer que o Industrial institucionalizou-se, pela forma Pop/ Rock – que pretendia destruir – nos milhares de discos vendidos de Ministry, Nine Inch Nails, Marilyn Manson e Rammstein. Pela pista de dança, como EBM, Gabba e Rave até ser transformada em música de carrinhos de choques – é especialmente grave esta facção de pimbas que chamam de Industrial ao Techno Gó-Gó…Pelos espectáculos circenses para massas fascinadas com a precursão de tachos e panelas, vassouras e latas do lixo. E por fim, as velhas bandas seminais ficaram “respeitáveis” e tocam nos dias de hoje em centros culturais de prestígio como Einstürzende Neubauten no Centro Cultural de Belém ou Throbbling Gristle (como X-TG) na Casa da música - aliás, até a razão deste artigo, os Sektor 304 também já tocaram lá.
Para além do que foi descrito nas linhas acima, para que serve o Industrial então? Qual o seu papel actual na música? Qual a sua relevância quando já sofreu mil metamorfoses e osmoses? Foi um movimento de vanguarda que está morto e agora é regurgitado em modelos mais limpos? Camuflou-se no seio do pós-modernismo? Ainda faz sentido vestir fatos de Nazis ou de Sovietes num concerto? Ou mostrar imagens de massacres étnicos ou vivissecção de animais? Terá o Industrial a missão politica de combater os Totalitarismos tal como o Black Metal tem como bandeira o Grande Cabrão ou os Straight-Edge o Veganismo e outros ismos?
Não sei nem creio que os Sektor 304 tenham as respostas para tal. De créditos firmados vão no seu quinto registo em disco, sendo já o segundo a ser lançado pela Malignant, editora norte-americana que é uma referência no pós-Industrial e outros “Darkismos”. A banda foi criada por João Filipe e André Coelho – grande ilustrador que tem participado nas antologias da Chili Com Carne – e passaram a quarteto neste novo disco, Subliminal Actions, com a inclusão de Henriques Fernandes e Gustavo Costa - um Gorbachev na música portuguesa! O som da banda tem sido comparado à génese do Industrial pelo facto de terem contrariado a tendência generalizada de fazer música de forma electrónica e digital. Os Sektor 304 perceberam que existe vida para além dos computadores e foram à raiz analógica desse som inaudível, violento e barbárico dos primeiros tempos de SPK ou Laibach. Podemos ouvir milhares de discos de Noise e Industrial nos dias de hoje mas são poucos os discos que nos marcam porque tal como 90% da produção musical nos dias de hoje, o digital prevalece e apaga os registos orgânicos da gravação – e não é por James Plotkin ter masterizado o disco que há muito tempo não se notava a diferença electro-acústica entre os Sektor 304 e os seus “concorrentes industrialitas” (ou de outros géneros musicais). Não há sinal digital que consiga ultrapassar uma amplificação de uma chapa de metal encontrada na rua a ser torturada com uma serra ou uma lima.
Sektor 304 é um monstro parido do universo de H.P. Lovecraft com a sordidez do desastre de Fukushima. As patadas desta besta sonora vêm do tribalismo rítmico de África – aliás, tudo (música ou não) vêm de lá! Esta associação e influência africana era assumida pelos primeiros músicos de Industrial, ao contrário das novas gerações embasbacadas pelos uniformes dos regimes totalitarismos ou o látex S/M que acham que a música Industrial é “branca”. Há de agradecer aos Sektor 304 nem que seja só por nos recordarem isto, desde 2009 aquando do álbum Soul Cleasing.
A juntar à violência física da besta, ainda somos obrigados a visitar as dimensões fatais de um outro mundo através do psicadelismo dos baixos e dos “noises” tão em voga dos dias de hoje. Há um momento alto no disco para quem não suporta apenas “psico-barulheira” – admito que o disco é longo e pesado - é o tema By the throat, verdadeira festa polirítmica com quatro registos vocais em discussão – em que o gutural Death (cortesia do vocalista dos Genocide) e o vampirizado Black ganham a batalha e são uma lufada de ar fresco para quem está habituado a ouvir o Industrial como algo cristalizado.
Não consigo deixar de relacionar a música Industrial com o que Alan Moore escreveu no prefácio de V for Vendetta, livro publicado no final dos anos 80 mas escrito pelo autor britânico nos inícios dessa década. Escrevia ele que achava as premissas do argumento dessa BD eram ingénuas – fruto da sua jovem idade – como pensar que seria necessário um Inverno Nuclear para que o Fascismo se pudesse instalar. A música Industrial em 1976 alertava do perigo do Fascismo disfarçado de Big Brother no futuro. Trinta anos depois este estilo de música espelha-se de uma forma deformada. Realmente o Fascismo já se instalou, invés de estender “fachos” temos bandeiras (de eventos desportivos, casamentos reais ou visitas do Porco-Mor Católico) nas janelas e varandas, vivemos reprimidos pelo Estado e grandes empresas (em que a vigilância é feita por nós próprios cidadãos censores e bufos), somos alienados por uma cultura hedonista, uma economia poluente em plena colisão entre a sofisticação técnica e a degradação humana. Se o Industrial ou os Sektor 304 têm alguma raison d’être em 2012 é porque simbolizam um “retro-futuro” ou um “Futuro Primitivo” (se me permitirem a “publicidade” a uma antologia de BD organizada por este vosso escriba e que André Coelho também participou) situada entre as maravilhas do mundo digital e o entulho dos excedentes… industriais.
Esta música “industrial” dos Sektor 304 simboliza (mais uma vez) o acidente que está para vir. Se o Apocalipse ainda não apareceu pelo menos já compôs a sua banda sonora. Então, que raios faz esta pérola na periferia da Europa onde ninguém lhes liga? Os gajos deviam era meter-se a caminho de Moscovo num tractor quitado a puxar um atrelado com a a banda em cima a tocar “non-stop”. Esta digressão Porto/ Moscovo devia-se chamar “Born Again Chernobyl” e anunciaria o Apocalipse, sendo a banda os seus Anjos bíblicos anunciadores – sugere-se o uso de Homens-Salsichas disfarçados à Gwar na dianteira do tractor! But I digress…
terça-feira, 13 de março de 2012
Haxixe? Táfixe?
Go Suck A Fuck : Para o seu marido (Cafetra; 2012)
A minha mulher comprou a colectânea da Cafetra e o puto Leo foi simpático em trocar-me o disco por outra produção da Cafetra... Apanhei com este Go Fuck A Suck ou-lá-o-que-é que em 19 minutos tocam 20 músicas. Não é um EP de Grindcore (podia ser pela duração/quantidade de temas) mas é antes instrumentais infra-épicos-juvenis tocados com guitarras Lo Fi e orgãos sujos por putos movidos, quase de certeza, a ganzas intervaladas com umas 'jolas e uns tiros na Playstation. O ritmo é calmo como se o Verão fosse eterno e não 19 minutos. Há quem diga que a juventude é desperdiçada nos jovens, o que é bem capaz de ser verdade mas os Cafetra Kids parecem estar a esbanjá-la bem - espero que ao menos se baldem às aulas para gravar estes discos!
segunda-feira, 12 de março de 2012
Logo Depois Da Vírgula - Livro de Geo-grafia /// ESGOTADO
Logo Depois Da Vírgula - Livro de Geo-grafia
de Mattia Denisse
Logo Depois da Vírgula é um projecto colaborativo. Foi escrito em português por Mattia Denisse, artista que tem o francês como língua mãe. O texto foi editado por Lígia Afonso, com as contribuições de Cristina Fino e Rui Almeida Paiva, segundo as regras do novo acordo ortográfico. As cartas que acompanham o livro formam o conjunto da correspondência, transversal à realização do livro, entre Mattia Denisse e Paulo Miyada. O posfácio é assinado por Nuno Faria. O projeto gráfico é de António Gomes e Cláudia Castelo - Barbara says…, com colaboração de Patrícia Maya. O livro é uma edição do autor e de Barbara says...
Tiragem: 500 exemplares, 100 em inglês
Apoios: Fundação Calouste Gulbenkian, Direção Geral das Artes e Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura.
Distribuição da Chili Com Carne / ESGOTADO
As viagens que cometo não são mais do que pedaços d’a Viagem. Desde o início, nomadizo entre “acampamentos de base” mais ou menos impermanentes. Atinjo o cume e volto a descer. Abasteço-me e subo outra vez. Pouco importa que o cume seja outro e pouco importa até qual seja; é sempre Ele. Talvez suba apenas para desfrutar, durante alguns instantes, de uma vista maior, de um ponto de vista singular. Em geral, quando chego lá acima, o céu nublado impede-me a vista para além da minha silhueta projetada na superfície das nuvens. Se acreditasse no que vejo, não continuaria a querer ver além do que vejo e dispensar-me-ia de me movimentar. Mas um curioso fenómeno, provavelmente interno, faz com que nunca acredite totalmente no meu olhar…
Mattia Denisse nasceu em França em 1967, em Blois, cidade de Robert Houdin (1), de Denis Papin (2) e de René Guenon (3). No entanto, ele não viveria em Blois, mas sim em Seur, na última casa da aldeia, uma espécie de Jardim do Éden e Arca de Noé à vez... Desde então, procura coincidir consigo mesmo.
(1) 1805 – 1871. Mágico inventor do truque (entre outros) que ficou célebre: A Suspensão Etérea.
(2) 1647 – 1712. Físico, matemático, inventor que trabalha sobre o vazio, sobre a força do vapor, sobre a água. Inventor, entre outras coisas, do digestor ou A Maneira de amolecer os ossos & de cozer toda as espécie de carnes em muito pouco tempo & de forma muito barata…
(3) 1886 – 1951. Autor de obras de metafísica e de esoterismo.
domingo, 11 de março de 2012
(On the quest for) Beograd Underground
On the Quest for Beograd Underground
Muriel Buzana, Espanha / Sérvia, 61’
Documentário sobre as movimentações alternativas de Belgrado que passam pela banda desenhada, música, artes plásticas ou aúdio-visual. A Sérvia vive um momento eufórico de produção artística após vários anos de guerra, sanções económicas e regimes ditatoriais. Curiosamente são entrevistados muitos autores e activistas da bd como o conhecido Aleksandar Zograf, e ainda Wostok, Septic, Vladimir Palibrk ou Johanna Marcadé.
Agradecemos ao Aleksandar Zograf que nos avisou deste documentário sobre a cena "underground" sérvia, onde aparece a "crew" toda da tournê Boring Europa. No gozo disse que o Marcos Farrajota agora é sérvio. Nós achamos até que ele deveria mudar o nome para Marko Faražotić e ir para Belgrado! Curiosamente ainda há pouco tempo tinhamos descoberto outro documentário daquelas bandas...
Koostella
No Off de Angoulême, foi uma surpresa bem agradável reencontrar o Koostella, autor brasileiro que vive na Suiça. Apesar de não poder tido grandes conversas com ele - é sempre assim em Angoulême - mas deu para pelo menos fazer umas trocas de livros seus, auto-editados em impressão digital e de tiragem ilimitada limitada - cof cof, quer dizer, por ser impressão digital ele pode fazer quantos quiser quando quiser mas o autor está a assinar e numerar as edições...
Vexame Vitae são 2 livrinhos A6 - tipo Filme da Minha Vida, etc... - que compila desenhos-vinhetas-cartuns (tudo isto e nada disto) que emulam uma banda desenhada que pode ser comparada aos abecedários mórbidos de Edward Gorey, o estilo gráfico é que se afasta totalmente do norte-americano, cabendo na linha grossa e pesada do "underground". O non-sense é bastante bem sacado e divertido. Mas melhor é Um Morto Que Vive, livro horizontal A5, que reúne 5 bds que se baseiam na citação "o livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive" de Padre António Vieira (1608-97). As bds têm grafismos diferentes e são independentes entre elas (excepto a última que faz um intersecção entre elas), e são escritas em riminhas, quase rídiculas que nos levam para uma Bossa Nova Comix, se tal coisa for possível de existir...
Para adquirir estes livros é favor de escrever para o e-mail ccc@chilicomcarne.com (20% desconto para sócios)
sábado, 10 de março de 2012
Prego #5 / últimos exemplares...
Para quem não pegou a Prego em Dezembro durante a visita a Portugal do seu editor, Alex Vieira, podem adquirir através do shop da Chili Com Carne os últimos 5 exemplares!
A revista foi convidada especial da 19ª Feira Laica onde teve direito a uma mostra e lançamento português do último número (o #5) dedicado ao "som". Neste número encontram entre vários autores da "nova bd de autor brasileira" dois autores portugueses e associados da CCC: Marcos Farrajota (com uma bd) e Manuel Pereira (colagens).
A passagem pelo tema "som" não é inocente uma vez que Alex Vieira tem uma enorme ligação ao Punk / Hardcore, mas na publicação há banda desenhadas que nos contam biografias de críticos do Rock, autobiografias, celebrações Black Metal, psicadelia de luxo graças ao sempre inesperado Diego Gerlach e algum típico "besteirol" brasileiro. A revista também publica fotografia, entrevistas a autores de cartazes de concertos Punk e ilustrações variadas...
Entretanto para quem já conhecia a Prego desde sempre, este novo número está com outro papel, um razoável aumento de páginas e a capa apesar de ainda ser mole está mais dura cheia de tesão juvenil brasileira. Ainda dizem que o Punk não rende...
Por fim, deixamos aqui um excerto da bd de Marcos Farrajota publicada na revista e que mostra a sua versão da geneologia Punk. Talvez venha a integrá-la no novo livro... quem sabe...
ccc@mab.invicta
Estaremos no primeiro fim-de-semana deste novo evento portuense de bd com uma mesa recheada das nossas edições (e dos associados) e teremos uma mostra colectiva intitulada de Restos Mortais na Casa Viva.
Marcos farrajota escreveu o seguinte texto para este festival:
Kai Pfeiffer (Berlim; 1975) é um autor que se pode colocar na injusta prateleira dos “autores residuais”, ou seja, aqueles autores cuja a obra é rica em sugestões, estéticas, conteúdos e abordagens mas que devida uma publicação menos ortodoxa, desaparece do olho público e até dos próprios especialistas.
No entanto, Pfeiffer foi um dos fundadores do colectivo Monogatari, que no final dos anos 90 iniciaram a bd reportagem na Alemanha. Pfeiffer tem sido também instigador de revistas como a Plaque e Flitter (ambas pela Avant-Verlag) e de exposições, tradutor e designer de livros e mais recentemente professor de bd na Universidade de Kassel. O seu trabalho como autor de bd e ilustrador dispersa-se em antologias (como as do Monogatari), revistas da especialidade (Strapazin), livros de autor (com o Le Dernier Cri) ou jornais (Tagesspiegel, Frankfurter Allgemeine Zeitung). Tudo isto, como podem compreender, são publicações bastante perecíveis, especialmente para quem não estiver alinhado às geografias germânicas. Isso não o impediu de ter participado na exposição itinerante åbroïderij! HA! – International Graphic Arts Exhibition, criada em 2008 pela organização da Feira Laica com o apoio da Bedeteca de Lisboa – aliás, com o seu colectivo Monogatari, Pfeiffer já tinha trabalho exposto na edição de 2003 do Salão Lisboa.
Sob uma perspectiva tradicional o seu trabalho “oficial” encontra-se em dois livrinhos, pertencentes a uma colecção comum, Revue Mondaine. O primeiro volume intitula-se Land e o segundo Stadtelphen / Urban elphesm, ambos de 2004 e editados pelo Monogatari. Se este colectivo existente desde 1999 sempre teve uma preocupação mais vivencial na bd, tendo investido em bd's biográficas e de reportagem, é curioso ver o trabalho de Pfeiffer que foge para deambulações gráficas que apelam a ideias fantásticas sem serem fantasia e escapismo pueris.
O primeiro é uma série de paisagens que poderiam contar histórias caso Pfeiffer "parasse a sua câmara" durante mais do que alguns "segundos" - ou será essa a tarefa do leitor? As terras que vemos são desérticas e sujeitas a fenómenos extraordinários embora nunca sabemos a sua raison d'être nem o que irá acontecer. Um paralelismo possível seria o Malus de Christopher Webster (MMMNNNRRRG; 2005) por justamente desse non-sense e falta de pontos de referência, mas também pelo virtuosismo gráfico de ambos autores - curiosamente ambos podiam ser comprados e admirados na "exposição impronunciável" da Laica / Bedeteca. O segundo título é mais contido mas não menos misterioso, tem o aspecto clássico de bd - ou seja vinhetas em sequências certinhas, tudo limpinho e bonitinho como manda o figurino - mas continuam a ser polaróides (um bocado mais movimentadas e sequenciadas) de fantasmas / espíritos que existem por aí. O ambiente ou a ideia podem parecer um bocado "freak" demais para os nossos espíritos tecnocratas e racionais mas Stadelphen não tem moral nem histórias, apenas se observam “bichos” no meio de carros, paredes, pessoas ou cinzeiros com uma inocência parva que nos escava da memória infantil o Fantasminha (Casper) porque se descobrem expressões faciais caricaturais nas criaturas desenhadas que transmitem uma alegria insuportável... Não é suposto todos nós sofrermos até depois de mortos?
E se isto serve de metáfora, o caminho do sofrimento para quem quiser o trabalho de Kai Pfeiffer em formatos mais sólidos – livros – irá acabar pois ele prepara um livro com Dominique Goblet – também presente no MAB – intitulado Plus si entente, a lançar pela Frémok, bem como outro a solo (também a sair pela Frémok) e outros dois projectos, uma biografia com a colaboração de um ilustrador e a adaptação de histórias de Alexander Kluge. Und plötzlich…
domingo, 4 de março de 2012
Kowaslski #1,2 (Samba; 2009/11)
A revista Kowalski é editada pela Samba só que... é melhor que a Samba! É mais sacana e caótica que ultrapassa a "revista-mãe", lembra como o suplemento Mau da revista Animal era melhor que a revista oficial que fazia parte! Os colaboradores são quase os mesmos (os fantásticos "Gabrieles"!) e admitimos que apesar da qualidade da Samba ela também é caótica mas no mau sentido, apenas porque falta uma direcção na paginação e se calhar um horizonte, a Kowalski saíu de forma espontánea. É um verdadeiro bordel virado para o non-sense e escatologia que acaba por resultar melhor que a "certinha" Samba.
Para quem gosta de Kaz, o "underground" desvairado, destruição iconoclasta, fotonovelas doidas, ou seja um intervalo enorme que tanto pode abranger a francesa Hara-Kiri (anos 60) à norte-americana Zero Zero (90), passando pela brasileira Chiclete Com Banana e afins, esta é a revista que precisam!
sábado, 3 de março de 2012
ccc@Mercadinho.dos.Horrores.no.Fantasporto
Enquanto a cidade pinta ruas de ouro para acolher um festival de pessoas e música giras, pelo bom nome duma companhia de telecomunicação, outros pólos criativos se estabelecem. O Hotel555 acolhe hoje um ciclo de performances e concertos, de entrada gratuita (com Kanukanakina e Ghuna X) e o Fantasporto, em decurso há mais de uma semana, organiza uma pequena feira de edição independente no Hard Club. Hoje, das 16h às 04h.
Com bancas da Chili Com Carne, Ruru Comix e Marvellous Tone.
(não há links de jeito, só merdas no facebook)