Escolhe a tua máscara!
É estranho ouvir o álbum original depois de ouvir o de remisturas... mas o mais estranho é perceber como um álbum deste passou despercebido pelos media (mais sobreviventes do que iluminados) como o Ipsilon ou o Blitz, quando se trata um dos álbuns portugueses mais importantes da década - ao lado dos Mão Morta (Nus), Stealing Orchestra (The Incredible Shrinking Band) e algumas produções da Matarroa (MatoZoo, Nerve, XEG) e FlorCaveira (Tiago Guillul). Desconfio que houve "lobby" do Rui Miguel Abreu que impingiu as tretas que editou pela Loop Recordings, uma vez que ele acumulava as funções de dono da extinta editora e como jornalista (Op, Ipsilon, Blitz) desacreditando o movimento Hip Hop, o fenómeno mais importante da música portuguesa desde o "boom" do Pop / Rock português nos anos 80 e a militância do Punk / Hardcore nos anos 90.
Mesmo que o Hip Hop tenha-se tornado mole e cristalizado como aconteceu com os géneros "libertários" como o Punk, Industrial e Electrónica, o facto é que só o pior do Hip Hop é que foi promovido, os que tinham a imagem limpa pelas editoras comerciais e pseudo-alternativas. O que é bom está nas margens, como sempre, como o caso de Máscara, um álbum que merece o estatuto de "clássico" que apenas peca pelo tema A História, a luta que inclui coros femininos fúteis R'n'B mas como o Ex-Peão canta de forma tão estranha até parece que está a gozar com algo... será uma "private joke"?
Mas vamos por partes, as letras de Ex-Peão são das mais lixadas que ouvi, mais que o "white-trash" do Nerve ou o neo-realismo de XEG, não tendo pejo em fazer acusação política - quero ter imunidade política como o Soares para poder trazer joias de África (...) quero candidatar-me à presidência da câmara / fugir para o Brasil para voltar com mais fama (...) quero fazer parte da Maçonaria para passar à frente a burocracia no tema homónimo que abre o CD - observação social (quase todo o álbum), alucinação religiosa (Guerra dos Anjos, O Amanhã) e ainda com direito a uma ode romântica-urbana (Noites frias).
O que é fabuloso neste álbum é que foge aos clichés irritantes que o Hip Hop português se foi entregando (masturbação e elitismo, excesso de duração dos álbuns, "beats" pouco imaginativos, ausência de personagens ou personalidades fortes mas quase todos com egos inchados). Consegue cumprir a regra pós-moderna de piscar para o passado (homenageando os Táxi com Bairro ou com a versão "up-grade" escondida de Pós-Modernos dos GNR) e a celebração do presente (Guerra dos Anjos tem a mão de HHY que consegue ser demolidor na produção entrando em Dub Industrial a lembrar o tratamento de Limb Shop dos Mécanosphère). Considerando o que foi feito depois com o disco de remisturas, em que se deve esquecer algumas javardices Transe e Dance, e já sendo a parte instrumental simultaneamente Hard e Groove, está bem longe do anacronismo de maior parte da produção portuguesa. Quase dá vontade de fazer um "best of" dos dois discos - no sentido de escolher as melhores remisturas para substituir os originais e passar a ter o álbum perfeito. Num artigo na Rua de Baixo: Ex-Peão não faz batidas que suportam as suas rimas, faz músicas, dando igual atenção às letras, às melodias e instrumentalização. (...) «Gosto de tocar, cada vez mais. Cada vez mais me interessa a produção musical, não só produzir batidas, mas também gravar as vozes, os instrumentos, misturar… Toda a produção musical». No mesmo artigo revela-se ainda que o músico (mais conhecido por integrar os Dealema): o percuso musical de Ex-Peão não se inicia no hip-hop, constituindo o metal, o industrial, o punk-hardcore, o techno e o drum’n bass referências estilísticas que foram incorporadas em “Máscara”; e ainda: «Eu não sou hip-hop tuga!», afirma.
Estupidamente orelhudo ao mesmo tempo que trata de temas sobre o desgaste dos nossos tempos, a selva urbana documentada por Ex-Peão tem a mesma relevância que teve o álbum de estreia dos Mão Morta, com a agravante que sabemos que (realmente) os (nossos) tempos pioraram. Portugal acompanha a maior tendência da "brasilificação" na Europa, ou seja o aumento cada vez maior do fosso entre ricos e pobres, e sendo Ex-Peão do Norte deve sentir mais na pele onde essas diferenças são mais nítidas.
Estupidamente orelhudo ao mesmo tempo que trata de temas sobre o desgaste dos nossos tempos, a selva urbana documentada por Ex-Peão tem a mesma relevância que teve o álbum de estreia dos Mão Morta, com a agravante que sabemos que (realmente) os (nossos) tempos pioraram. Portugal acompanha a maior tendência da "brasilificação" na Europa, ou seja o aumento cada vez maior do fosso entre ricos e pobres, e sendo Ex-Peão do Norte deve sentir mais na pele onde essas diferenças são mais nítidas.
Um disco obrigatório para os 00. Ei!
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