quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Infecção Urinária de Natal

Assistimos actualmente na música portuguesa a uma praga de gafanhotos, perdão, “cantautores”! Se a primeira vaga de “cantautores” da FlorCaveira tinham piada por causa da militância (o seu cristianismo protestante Baptista), um aparelho DIY e conceitos exóticos (“panque roque do Senhor”, “panque medieval”, etc…), pouco a pouco, como aliás é habitual quando uma “cena” aumenta de importância e de exposição pública foi-se amansando como um cachorrinho caseiro.

Percebe-se que a FlorCaveira tenham recuperado figuras perdidas como Jorge Cruz ou apostado no novato B Fachada e no “cantaurorismo” como forma de trazer a língua portuguesa de volta ao consumo Pop depois do vazio pseudo-Aldeia Global dos anos 90 – é irónico que quem enche Coliseus à fartazana sejam os Ornatos Violeta, a única banda Pop que cantava em português nos anos 90 e não os que se quiserem internacionalizar-se à força como Silence 4 ou Blind Zero, que isto sirva de lição a quem quiser!

Passada a moda e mediatismo desta editora / colectivo, os seus restos mortais são um legado cristalizado de arrestas limpas para consumo fácil como é o caso de José Camilo na sua Viagem ao subúrbio (auto-edição; 2012) onde encontramos uma moleza, fácil de comparar a casos históricos como UHF ou Lobo Meigo, Pop / Rock armado em chico-esperto que tenta parecer inteligente por causa de alguns “breaks”. Também é o caso de As Oportunidades Perdidas de Bruno Morgado (FlorCaveira; 2012) que soa logo no início ao Vitor Espadinha, só lhe falta a tesão sem ser para procriar. Ou queria ser o Leonard Cohen? Seja como for a coisa avança para outros cenários como os de Lee Hazelwood, B Fachada e o Festival da Eurovisão...

A excepção a este rame-rame é Tiago Guillul que instiga, grava e edita como um louco, sendo capaz de ir ao fundo da questão, sem se deixar cair nas fórmulas comerciais fáceis, roubando samplers ao Punk, ao Metal e à World Music para criar os seus discursos com fundo original e independente – coisa que rareia na música portuguesa em particular e na criação em geral. Guillul é um pregador, ora um pregador prega! Tem de estar atento ao mundo e não se fechar em copas, não pode parar com figuras de estilo e discursos vazios. Não é preciso cursos de semi-óptica para se perceber que Guillul fala dos (nossos) tempos nos seus relatos, independentemente da mensagem cristã, é dos poucos músicos que faz um retracto da sociedade portuguesa no século XXI. Outro ponto a favor…

Para além da sua produção que já lá iremos, também é capaz de chatear malta para fazer compilações como Ruptura Explosiva (Amor Fúria + FlorCaveira + Um Disco Pronto e Sincero; 2011) que é mais barata e bem melhor que qualquer colectânea dos Novos Talentos da FNAC (1). Há várias razões para afirmar isto apesar de nenhuma destas malhas merecer estrelato, uma delas e a principal é que se trata de um trabalho de “comissário”, ou seja, Guillul escolheu bandas para dedicarem o seu trabalho a um tema – um tema xunga, é certo, que é a comemoração dos 20 anos do filme de acção (e surf) Ruptura Explosiva com Keanu Reaves e Patrick Swayze. Graças a gesto simples de “curadoria” dá coerência e tom ao disco, sem este deixe de ser ecléctico q.b. Fala-se num texto do CD em Rock mas disto há pouco – o único momento digno de tal é o primitivismo dos Borboletas Borbulhas – porque de resto há sobretudo muito “cantaurorismo” e Electrónica manhosa – entre elas um tema de Te Voy A Matar que apareceu na banda sonora do Futuro Primitivo (Chili Com Carne; 2011). O disco sabe a mar e verão (inevitavelmente) sendo que hajam várias abordagens de trabalho neste “tributo do filme”, desde de se cantar do genérico do filme (Pega-Monstro com Rabu Mastah – não devia estar este tema no fim do disco?) a “samplar” pedaços do filme para incluir na música (Aquaparque com Nudista Prateado) ou usar o material sonoro do filme para fazer a música toda – como fez Ben Lacrau que sampla os socos, tiros e afins para fazer deles os bombos, tarolas e tudo o mais da música. Pena ter recebido o disco no Outono de 2012 e não ter curtido isto na “silly season” de 2011, teria sido bem mais fixe…

Entretanto, a tempo e a horas aparece o sexto disco de Guillul, intitulado Amamos Duval (FlorCaveira + Um Disco Pronto e Sincero; 2012), um álbum duplo, anacronismo marado uma vez que os CDs conseguem ter 80m de música e estes dois CDs não chegam a tal. Mas Guillul é um “artista bruto” com educação e programa filosófico próprio que apesar de não ser um caso clínico (como Daniel Johnson e afins), não deixa de ser interessante fazer um paralelo com estes “doidos visionários”. Guillul, como esses outros autores, não se desvia da sua senda, daí que mantem as características que nos habitou no passado, como as canções com contos autobiográficos, alguns com intervenções directas das suas crias; aparece sempre uma crítica social alinhada à sua postura retrógrada que tanto soa a brilhante como o tema Estás casado com o Estado em que a letra é uma explícita caricatura do artista rebelde - Espera aí que estás casado com o Estado / mas queres fazer figura de solteirão -, ou pode ser completamente irresponsável como Faz Filhos, em que Guillul com orgulho de Velho Testamento exibe os seus 4 filhos na contra-capa do disco e neste tema em especial apela à reprodução da nossa horrível raça. Claro que há um humor em toda esta criação mesmo que seja um humor Baptista que não se possa perceber na totalidade. Parece um misto de Fungagá da bicharada, teeny-boopy deslocado, folktrónica e vanguarda indesejada. Tal como os “artistas brutos”, Guillul é genial, nas suas produções onde tanto entra Ratos de Porão como Stealing Orchestra, Justin Bieber ou Chuva na Areia… O álbum duplo só se justifica por um excesso de produção como é típico dos “brutos”, espíritos inquietos e criativos que Guillul cada vez mais se revela como tal.

A vantagem de trabalhar sozinho é que tudo o que sai é puro! E topa-se que um ano antes, Tiago ao encarnar com uma banda, Os Lacraus que Encaram o Lobo (FlorCaveira + EMI; 2011) acaba por ter um compromisso que implica monotonia musical. Síntese das ideias desenvolvidas entre ele e acólitos, feita das orações gravadas em dezenas de CD-Rs de edição limitada, aparece com manias de grandeza - por gravarem para uma editora profissional? Sei que acabei de escrever um cliché – quando se grava para uma multinacional és um vendido - mas é quase impossível não fugir ao cliché quando se ouve o tom épico de catedral à Arcade Fire e se rouba à descarada a face limpa dos Clash. Já não é a primeira vez que aviso desta perigosa iconoclastia (ou “cultural jamming”) destes cristãos, que estão a subverter a cultura popular não para nos iluminar mas para nos cegar com as promessas divinas do pós-morte e do pós-Apocalipse. Resta-nos relembrar um grego que disse que “os mortos valem menos que merda” (2) para não nos preocuparmos com as ambições dos produtos da FlorCaveira. Não deixa de ser delicioso a sua crítica social reaccionária – infelizmente não há muitas bandas a destilarem algum ódio aos maricas do Bairro, por exemplo. Ainda assim é um disco limpo e arranjado que se torna “flat” como a capa ilustrada de André Andrade.

Pelo menos todas as capas destes discos são ilustradas! E é assim que deve ser!

(1) não admira que esta cadeia de lojas esteja para fechar…
(2) citado algures em “Contra os Cristãos” (Estampa, 1991) de Celso

sábado, 22 de dezembro de 2012

Boa Laica, boa Laica, boa Laica, boa Laica, boa Laica, boa Laica, boa Laica, boa Laica...

Que a última Feira Laica tenha corrido muito bem já não é novidade para ninguém... Mais visitantes do que nunca - e visitantes compradores, diga-se! -, maior presença de autores / editores nacionais e estrangeiros, etc, etc... mas o mais importante que quantidade é a qualidade. E nunca antes se viu tantos objectos que desafiam as prateleiras das lojas com tão bom aspecto e conteúdo. Quero aqui fazer com este "post" um realce a algumas das edições que mais me impressionaram:

1) Platypus Collective - são ilustradores para a infância que decidiram unir-se e rentabilizar trabalho criando um zine para crianças (até aos 10 anos). Apesar da minha vasectomia irreversível e a frieza que tenho em relação à ilustração para crianças que geralmente aparece fiquei deveras impressionado de haver um zine para putos (já com 6 números) com um tom gráfico divertido e curtido! De negativo algumas BDs que tem erros técnicos de leitura (balões de resposta antes da pergunta, por exemplo) e alguma legendagem de díficil leitura. Têm melhorado de número para número... muito fixe e algo oposto ao que se normalmente se vê por aí...

2) Transgressions (Wormgod; 2012) é o novo livro do Mattias Elftorp em colaboração com Sussane Johansson (elementos visuais) e Feberdröm (música) que conta uma parábola de transformismo meta-radical, que longe das magias divertidas de Alan Moore ou Grant Morrison, é tão eficiente que nos enche de esperança sobre esta coisa horrível chamada Humanidade. é um conto anarquista brutal numa Era que precisa de alguma Poesia... De realçar o novo estilo gráfico de Elftorp que largou a tinta para deixar o lápis fluir mais. O livro é acompanhado por um CD de música Noise, verdadeira banda sonora da BD. Muito bom!

3) O novo número do El Temerário! É o 8, editado como sempre pelo Martin López Lam via Ediciones Valientes que repete as fórmulas do seu "graphzine" excepto que neste número fez um "dossier" dedicado à ilustração portuguesa em que vamos encontrar os nossos associados André Lemos, Margarida Borges e Bruno Borges, entre outros... Inclusive Lemos fez a capa que se transforma num fantasmagórico poster (imagem ao lado). Que bueno!

4) Doom Mountain #1 de Zé Burnay é um "comic-book" deste novo autor de BD - e criador da imagem desta última Laica. Burnay faz parte de uma nova geração de autores de BD portugueses - onde se inclui Uganda Lebre, Rudolfo, Afonso Ferreira e André Pereira - que desenham como coelhos se reproduzem, em estilo que pisca olhos a estilos gráficos comerciais e de autor, e que contam histórias igualmente em terra de ninguém. Talvez o mundo tenha mudado e as pessoas estejam mais inteligentes e mutantes, não sei... Nesta BD, que é de continuação, temos uns ganzados que tentam sobreviver aos ataques de Zombies feitos de Cannabis! Não é só para quem curte ouvir os Weedeater ou até os Black Bombaim... Fuuuuuuck!

5) E por falar em André Pereira, este com João Machado fizeram um split'zine de BD bem fixe! Se os nomes em cima revelam uma lufada de ar fresco na estafada BD portuguesa, este Inner Math / Megafauna (Clube do Inferno) têm pinta de furacão Sandy! Machado escreveu, Pereira desenhou em dois estilos diferentes que aumenta a confusão de referências anteriormente citadas. Agora sinto que estamos entre os números do comic-book Epoxy, Rick Veitch, José Feitor e Kevin O'Neill... Não é fatela comparar a estes nomes todos porque há aqui um estilo a formar-se que em breve poderá chamar-se de André Pereira. De resto, o "split'zine" é antes um "flip'zine"  porque lemos duas BDs que se complementam ao termos de virar o zine para poder ler um dos "lados". Boas ideias e bons desenhos, o que se pode querer mais?

6) Não curto a onda dos graphzines ou de fotografia mas achei piada ao CVTHVUS, zine que prova que o mundo digital foi feito para admirarmos o gatos e os dois primeiros livros de Spurenelemente novo projecto dos alemães Dice Industries e Andrea Schneider, que produzem brochuras com fotografias encontradas - como as férias de um casal na Jugoslávia em 1986 - Jugoslawien'86 - ou de outro casal sempre acompanhados por um cão - About a dog. Funny stuff...

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O Pequeno Deus Cego

David Soares (a) e Pedro Serpa (d)
Kinpin Books; 2011/12

Apesar das tropelias comerciais deste livro, este publica uma BD que vale bem apena ler não tivesse a garantia do "Selo de Qualidade Soares" que ultrapassa as opções "guethisadas" da editora. Ora vamos a elas: é anunciada como uma segunda edição mas só é detectável como diferença com a primeira é uma inversão das cores da capa, e sendo a edição impressa digitalmente é desleal chamar a uma reimpressão de pouca tiragem (que é o que é na realidade toda a edição em impressão digital) de segunda edição. Mas se os grandes editores fazem este tipo de publicidade porque não podem fazer as pequenas? Só acho que as pequenas podiam ser menos demagogas, é tudo... Depois há a inclusão de um prefácio de Nelson Dona (Director da BD Amadora) a qual eu pergunto quem quererá uma coisas destas dada a falta de nexo deste festival? Estes factos são uma poça pantanosa que assustaria qualquer um em pegar no livro mas (e com o David Soares há sempre um "mas"!) a obra em si não tem culpa das cromices do seu meio editorial. Não é à toa que o livro tem merecido destaque dos (poucos) críticos de BD em Portugal e mereça também esta pragmática "segunda edição" de mais exemplares a sairem à conquista de mais leitores.
O livro lê-se rápidamente como aliás já tinha acontecido com outras recentes produções de Soares, a lógica aqui é a de "conto em BD" onde como escritor literário o David Soares tem já uma longa e rica carreira - desde 2001 que é oficialmente um excelente contista. Este livro, tal como o anterior Mucha (Kingpin Books; 2009) marca um regresso de Soares à "BD conto", que é um "back to basics" no início da sua carreira de autor de BD quando editava fanzines pela sua editora Círculo de Abuso - ainda esta antes de ser oficializada como editora de livros em 2000.
O problema dos contos é que quando são bons sabem a pouco - é o caso - deixando salivar por mais e mais. Nesta BD, seguimos uma criança eunuca e cega numa China "anacrónica" (?) à procura de conhecimento... Bem... nem é bem sobre Conhecimento (ver crítica de Moura in Ler BD) mas como a BD é curta seria xunga revelar mais. Lê-se como se fosse haver um segundo volume - tal como gostariamos que tivesse acontecido com Mucha. Espera-se uma continuação no final do livro... Será isto bom? Eu creio que sim...

sábado, 15 de dezembro de 2012

ccc@última.feira.laica


ÚLTIMO acontecimento do maior evento de edição independente em Portugal!!!

Editores presentes: Associação Chili Com Carne, Bazar do Diabo, Cafetra Records, Canto do Baú, Carapau Amarelo, CVTHVUS, Conversas, Dedo Mau, Dice Industries + Spurenelemente (Alemanha), Dildo Doodles, Ediciones Valientes (Espanha), zine É Fartar Vilanagem, Façam fanzines e Cuspam martelos, Filipe Abranches, Geraldes Lino + Dona Zarzanga, Grupo Entropia, Hepta, Imprensa Canalha, Inês Almeida, INOMINÁVEL fanzine, João Machado, Jorge Oliveira, Leote Records, Lucas Almeida, Marvellous Tone, Mike Goes West, Mr. Spoqui, MMMNNNRRRG, Nelson Jesus, Nicotina Zine, Oficina do Cego, Opuntia Books, Panda Gordo, Pangrama, Papeleiro Doido, Platypus Collective, Ricardo Castro, Rui Rafael, Senhora do Lago, Serrote, Thisco, Stepping Stone, Tonto (Aústria), Wormgod (Suécia), revista Zone 5300 (Holanda), Zulo Azul (Espanha)...

Algumas novidades editoriais
- ***, novo baralho de Ricardo Castro
- Antibothis, vol. 4 (Chili Com Carne + Thisco), livro + CD de Ocultura
- Cleópatra #8 (Façam fanzines e Cuspam martelos), zine de BD e ilustração de Tiago Baptista
- Deathgrind #2, zine de Zé Burnay
- Inferno (MMMNNNRRRG), livro de BD de Marcel Ruijters (adaptação de Dante)
- O Hábito Faz O Monstro (Chili Com Carne), livro de BD de Lucas Almeida
- Silje (Marvellous Tone), k7 de Manta

E ainda há a exposição 20 anos de Mesinha de Cabeceira, convidados estrangeiros, concertos (Presidente Drógado, Bandeira Branca, ...), exibições de filmes, livros e discos em 2ª mão a preços laicos! É a loucura!!

É ir ver o blogue oficial: feiralaica.wordpress.com

domingo, 9 de dezembro de 2012

E porque todos falam disso...





Todos falam dos "e-books" e o fim dos livros impressos... Entre as mentiras que se vão pregando sobre a ecologia dos e-books em contraponto às óbvias vantagens de portabilidade do digital acreditamos que é possível trabalhar os dois formatos sem histerias e dramas, tanto que várias das nossas edições já tem versões digitais. Começámos já em 2007 por colocar zines esgotados para descarga gratuita em formato PDF: Mesinha de Cabeceira #13 (de Nunsky), Allen (de Isabel Carvalho) e o Chili Bean - é só seguir as respectivas ligações.
Scorpio Rising (...) de Ondina Pires, A Segunda Vida de Djon (...) de Nuno Rebocho e Cadernos de Fausto e Algumas pessoas depois, ambos de Rafael Dionísio não estão ainda esgotados mas existem como "e-books" na plataforma todoebook - a metade do preço que a versão papel. Os títulos mais velhos estão disponíveis desde Agosto de 2010.