segunda-feira, 28 de maio de 2007

O primo de Jesus era panque!

Já referidos aqui, foi no aniversário da Chili Com Carne que recebi a totalidade das edições da FlorCaveira, editora de bandas de cariz cristã (Baptista) de roque enrole. Dada a quantidade já razoável de edições lançadas desde 2002 terei de fazer uma vistoria rápida e cirúrgica aos discos, até porque na essência as características descritas na resenha da colectânea Cinco subsídios para o Panque-Roque do Senhor mantêm-se ao longo destes outros discos.

Começamos por Tiago Guillul, mentor da editora, e a sua estreia com Fados para o Apocalipse contra a Babilónia (2002) que é talvez o melhor dos seus outros discos [Mais dez fados religiosos de Tiago Guillul (2003) e Tiago Guillul Quer Ser O Leproso Que Agradece (2003)], pois é o que consegue criar um ambiente mais intimista digno do melhor daquilo que se chama de "cantautores" em que incompreensívelmente se fez de Old Jesuralem o expoente máximo. Num país de complexados é natural que aconteça mas esqueça-no porque aqui está o "real McCoy"... em português! O fado é mutante ou até residual (são apanhados mais tiques do que modelos - e ainda bem, não teria paciência para a merda dos faduchos que impestam a nossa cultura), as letras são mundanas variando entre a autobiografia (Quis ser jornalista), crítica social (Fado da minha vizinha ou Fado da Ana Russa), de imaginário bíblico (Fado do Mar Vermelho) e de mensagem cristã (Fado do poço Samaria). Muitas vezes o timbre lembra os Violent Femmes. Musicalmente tem uma base acústica mas o que não impede de recorrer ao computador para pequenos loops e ruídos, estas brincadeiras tecnológicas são mais evidentes nos Mais dez fados (...) que quase vai parar ao António Variações sem a líbido e mais próximo da catequese. Dentro da mesma seita (como?) de cantautor cristão baptista está O caminho ferroviário estreito de Samuel Úria (2003) com uma voz mais "Pop" e menos sentido de humor que Guillul. É também mais bluesy e com as intervenções de piano sentimos um espírito (pois pois) de Tom Waits embora o tema Socorro parece que saiu directamente do Pure Guava dos Ween.

Em paralelo estão Tiago Guillul quer ser o leproso que agradece e Samuel Úria & as Velhas Glórias (2005), dois EP's que se ligam à electricidade roqueira. No primeiro caso Tiago toca todos os instrumentos do roque (guitarra, baixo, bateria) mais alguns outros - para não dizer que no melhor espírito DIY é ele que faz o design dos discos além de produzi-los e editá-los! Gosto particularmente de A Isabel é intelectual («porque perdeu a virgindade na Feira do Livro») além dos títulos Tu tens o coração do tamanho do Salmo 119 (seja lá o que isso quer dizer). No segundo caso trata-se de um duo, Samuel Úria (baixo, guitarra, letras, voz) com Guillul (bateria, segundas vozes, produção) que em menos de 1/4 hora mostra toda a sua pica de panque roque.

Guel, Guillul e o Comboio Fantasma (2003) é Roque garageiro MMP que irrita pelo moralismo assumido das letras («não fumo charros prefiro jogar matrecos» entre outras falhas humano-pagãs) embora haja momentos bons de roque cantorável, afinal ainda «há uma canção em mil na tua rádio estéril». "O pessoal Caveira" encontram-se todos em A sessão de Água de Madeiros dos Ninivitas (2005) talvez o disco mais trabalhado da FlorCaveira que está mais para a missa do que para o roque, ou mais para acampamento faternal de escuteiros com um Jorge Palma tão puro como lã de ovelha da quinta biológica. Admito que enjoei de ouvir este "panque medieval" - como eles lhe chamam. Para quem gostava dos Resistência eis um álbum que os metia de K.O. no primeiro round!

O Outono melancólico das Borboletas Borbulhas (2003) é Hardcore fodido (desculpem o palavrão!) com rasgos de panque roque. É aquele clássico de máximo de faixas (36) em menos tempo (40 minutos) sendo que a faixa mais longa tem menos de 2 minutos. As bandas portugas do Core e afins deviam aprender com este bravo apóstolo pós-moderno de Deus que gosta de gatos (yeah!) - sim, porque falo de Guillul que toca todos os instrumentos, canta e grunha como um possesso! Juntamente com os Jerusalém (para quando um disco a solo?) tornaram-se nas minhas bandas favoritas desta comunidade... «Tens o teu cão da moda assassino» GROOOOOOOUUUUUUU!!! Mais softs são os Pontos Negros (2005?) que são uma confusão de intenções, ora andam pelo Hardcore barulhento como a seguir pegam na guitarra prá balada xungita. Falta-lhes humor mas tornarão-se mais interessantes nas futuras colectâneas da FlorCaveira
E por fim, justamente a última edição da editora é A FlorCaveira em Frequência Modulada (2007) que reúne as gravações feitas para a Antena 3 (programa Portugália de Henrique Amaro). O CD-R está embalado num envelope A5 que tem um desenho porreiro impresso - estes gajos não tem as capas nos sítios oficiais!? Tocaram os Pontos Negros, Lacraus, Ninivitas e As Velhas Glórias, cada banda faz uma versão de outra música (e mergulharam nos GNR, Heróis do Mar e Lena D'Água - os Ninivitas vão buscar um cântico tradicional religioso) e cada faixa é interrompida pelas bandas a apresentarem-se ou a explicarem os temas. Ouve-se como um programa de rádio em que uma MMP em português e com qualidade reina. Onde se consegue isso nos dias de hoje? Em CD's de Hipe-Hope, claro! Mas se quiserem um som Roque será só aqui!

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Samizdata Club com MIMETIC


AMANHÃ MIMETIC + Structura + Mikroben Krieg
Mais uma vez proporcionamos a vinda de Mimetic, um dos mais importantes projectos electrónicos internacionais, quer pelo historial quer pela sonoridade única e demarcada. Membro dos Von Magnet e Universe Zero, tem edição frequente pelas labels Hands, Ant-Zen,.... e Thisco. Primeira parte a cargo de Structura e Mikroben Krieg. www.myspace.com/mimetic

No Espaço - Centro de Desastres ... Entrada: 10€ c/ CD Thisco ... Reservas para thisco@thisco.net

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Samizdata Club é um espaço ultracultural de confronto e experimentação artística e social incentivado por um colectivo de editoras discográficas, bd, produtores musicais, djs, vjs, designers que decidiram dar resposta a lacunas existentes no panorama artístico nacional através de sinergias e parcerias, de forma a criar uma efectiva rede de disseminação de informação por canais alternativos.

The Beginning is the End is the Beginning

Duas revistas de bd espanholas... uma acaba a outra (re)começa, é a vida!

Quem não conhecia Nosotros Somos Los Muertos (NSLM) deveria ter vergonha para começar e agora bem pode esquecer porque ela acabou com o número 15 (Sens Entido + Inrevés; Abr'07) justamente este ano que ganhou o prémio de Melhor Revista no Festival de Barcelona. Dirigida por Max e Pere Joan, teve várias fases desde que apareceu em 1993 como zine fotocopiado com uma bd de Max. A bd reflectia a sua frustração em relação à guerra nos balcãs e acabou por servir de catalizador para o seu regresso à bd.
Depois passou a antologia tendo mudando algumas vezes de formato, ora parecendo a Lapin (ou a última série da Quadrado) ora num formato respeitador e grande de revista. Mudou de editoras várias vezes. Publicou o melhor que havia de novas tendências internacionais da bd e ilustração numa altura que ninguém queria saber de Chris Ware ou de Keko em Espanha.
Os tempos mudaram, em Espanha voltou-se a respirar bd - ex.: edita-se quase toda a bd do mundo, o Estado reconheceu a sua importância atribuíndo um Prémio Nacional e até já há promessas electorais de museus e mais prémios a caminho! Os seus editores acharam que já era tempo de acabar: missão cumprida. 70 e tal autores despedem-se da revista com umas colaborações mais viradas para a ilustração do que para a bd deixando um trago fraco para uma despedida deste calibre. Pena! [3,9]

BD Banda iniciou-se num novo número um (BD Banda; Abr'07) porque parte para uma segunda série. Foi fanzine, agora é revista, continua escrito em galego...
Tem um formato de comic-book, 64 páginas a cores e quer-se um projecto comercial. E consegue porque parece um catálogo sacado às editoras francesas Delcourt ou Dargaud tal é o nível profissional e capacidade mimética dos seus autores. Aliás, Espanha tem essa tradição e capacidade de trabalho há imenso tempo, desde os anos 60/70 que fizeram bd para os EUA (revistas de terror) ou nos 90 nos comics de super-heróis.
Aqui é aventura e humor nos géneros policiais, steam-punk, humor e cruzamentos de géneros. Quase todas as bd's esquecem-se depois de se ler excepto a de Jorge Garcia com David Rubin - em parte pelo virtuosismo e dinâmica do desenhador. Completa-se a edição com um artigo sobre Franquin (grande autor é certo mas escolha tão interessante como ver o caixote-wc dos gatos) e uma entrevista a Miguelanxo Prado. Não é má a revista mas não me impressionou. Pena! [3]

sábado, 12 de maio de 2007

ccc@Festival-de-Beja



Até dia 20 de Maio, volta o Festival Internacional de BD de Beja - terceira edição - que vem demarcar-se como o mais importante festival de bd em Portugal com a extinção do Salão Internacional do Porto e o Salão Lisboa de Ilustração e Banda Desenhada. Infelizmente, dada a corrupção e tacanhez dos autarcas das duas maiores cidades do país, será no profundo alentejo onde iremos encontrar um festival de bd contemporânea.
O único defeito a apontar será a falta de ousadia nas propostas do festival, comentário este que na realidade não significa muito pois se por um lado os nomes de autores estrangeiros como dos espanhóis Max e David Rubin ou do alemão Ulf K são repetentes de outros festivais, vamos encontrar alguma surpresa nas apostas nacionais... e falo de gente pouco (re)conhecida como José Manuel Saraiva, Maria João Worm, Pedro Rocha Nogueira e o nosso associado (e que desenhou uma nova moldura no site remodelado) André Lemos - que segundo rumores, seria o autor de eleição para o Salão Lisboa 2007.
Com mais de 40 autores, 15 exposições patentes ao público, mais de 450 originais em exposição, o Festival de Beja ultrapassa os binómios litoral/província ou norte/sul, Maio será mesmo o mês da bd no país inteiro!
...
Os títulos da CCC e associados (MMMNNNRRRG e Opuntia) estarão representados no mercado do livro do festival.

ccc@Samizdata Club

HOJE, XOTOX + Sci Fi Industries vs shhh..., afterparty com DJ Yggdrasil e Bak_Teria

Um dos projectos mais aguardados no nosso país, a julgar pelo número de aficionados, traz-nos pela primeira vez a Portugal a sua electrónica power noise extremamente apelativa e dançável. Coincidirá com o lançamento oficial do 4º álbum de Sci Fi Industries, "Drafts and Crafts", comemorativo dos 10 anos de carreira e que contêm remisturas de XOTOX, Mimetic, Ah Cama-Sotz, Flint Glass, shhh..., Mikroben Krieg, [f.e.v.e.r.] e Structura.
No Karnart [Rua da Escola de Medicina Veterinária 21, Lisboa (à Estefânia), Metro: Picoas] Entrada 15€ (13€ para associados da Thisco e do Industrial.pt) com oferta do CD de Sci Fi Industries

na banca da Thisco também estarão títulos da CCC à venda

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Maravilhoso coração de máquina

v/a: "Marvellous Tone - sampler CD 2007" (Marvelous Tone; 2007)
Depois de bulhas por causa do Acid da Semana até pensava que nunca iria mais ter amigos no Porto, convicto que o pessoal de lá é ou provinciano ou arrogante ou ainda atrasado-mental... E no entanto, não é bem assim, o Augusto Sou Eu enviou-me a última produção da editora / colectivo Marvellous Tone. Trata-se de mais uma excelente antologia que segue o "Kix Shake, vol.1" (ver Underworld #20).
Em menos de meia-hora, 7 projectos conseguem investir nas coordenadas de electrónica contemporânea. Começa com um Acid renovado pelo Acid da Semana com Gonçalo Moreira e Pedro Santos (seja lá quem forem...) muito mais cool e trabalhado que o CD-R homónimo. Segue-se Ambient Glitch de Napa, que serve de entrada para os breakbeats de Coex e Último. Ghuna X & Hermitage quebram o ritmo com uma faixa cerebral q.b. até que... uma cantinela do Projecto Gentileza baralha tudo ao vir cantar de... sopa! Resta-nos o caos electrónico de Tonkee para esquecermos o que ouvimos.
A capa é serigrafada com corres berantes tirando o partido desta técnica de impressão, e pode-se dizer que a Marvellous Tone está-se a tornar numa das editoras de música electrónica portuguesa de eleição. A Thisco que se cuide!!!

terça-feira, 8 de maio de 2007

OuDiPo

OuMuPo, vol. 6
(0101 / Ici d'ailleurs; 2006) de Killoffer

1. E porque é que os críticos são sempre considerados artistas falhados!?
2. Nesse caso - "se temos a fama ao menos que tiremos o proveito" - venho aqui FUNDAR a OuDiPo (ouvroir de diffusion potenciel), movimento criativo congénere do OuLiPo (seminal neste tipo de abordagem e dedicado à literatura), OuBaPo (bd fundado pela L'Association) ou OuMuPo (Música).
3. Tal como o OuLiPo fundado nos anos 60 do século passado em que se criaram exercícios literários baseados em restrições matemáticas (trocar o substantivo de um texto pelo respectivo sétimo substantivo encontrado no dicionário) também se pretende que se deve explorar novas formas de divulgar / criticar objectos artísticos (discos, livros, peças de teatro, filmes) segundo uma constrição. Alguns exemplos de exercícios já realizados por aqui: escrever com se fosse de outra nacionalidade, usar os tradutores automáticos, misturar o texto de forma aleatória, escrever em modo de futurologia, roubar crítica de outro e mudar algumas palavras, fazer uma pastiche, ...
...
a) As editoras (de bd) L'Association e (de música) Ici D'Ailleurs juntaram-se para este plano ambicioso de lançar uma colecção de discos com bd's em que são usados parâmetros Ou-X-Po, mais concretamente OuMuPo e OuBaPo.
b) Assim os autores de bd tem 16 páginas (4 vinhetas cada) para pegarem em desenhos de outros artistas (devem usar pelo menos 5 artistas do catálogo) e remisturar / recriar uma bd, entre mais outras pequenas restrições - podendo também o artista criar as suas.
c) «e então?» perguntam vocês... bem, nada de especial... o livrinho parece mais um wallpaper ou um suplemento do CD do que uma obra com carisma. A piada da bd parte da descrição do jogo de xadrez entre Marcel Duchamp e Edouard Verschuere, em 1923. É giro para folhear no sofá burguês enquanto se ouve a música do DJ Krush, só isso...

3,5

terça-feira, 1 de maio de 2007

Ant Vag

Filipe Felizardo
Marieta Filmproduktion, 2007

É giro ver destas coisas, dos putos a crescerem... eu explico, o Filipe foi um aluno meu nos cursos de bd e pelos vistos não o consegui convencer da superioridade da bd (como todos sabem, a melhor das artes!)... pelos vistos o Filipe está mais interesado em Cinema (oh!) mas pelo menos os ideais DIY e zinistas ficaram. Daí que passado alguns anos, o Filipe aparece numa Feira Laica com este DVD com uma embalagem toda feita à mão... o que suponho que não seja normal num país em que Cinema ou Vídeo signifique apenas subsídio estatal ou trabalho na TV.
A atitude é das melhores embora o trabalho não seja da minha preferência pois achei-o demasiado juvenil: solidão + depressão + macacos do nariz... mas o que se pode esperar do Filipe que tem 20 anos? como o tempo passa... snif, snif... Mas vagueio... eh... Há uma preocupação estética e há algumas cenas engraçadas semi-estranhas quando Filipe veste um fato de fantasia muito fixe de um pínguim mas ele acaba por não explorar muito mais as potencialidades trágico-cómicas do fato... A sensação que ficamos depois de ver esta "Antologia do Vagar" é que apesar do Manoel de Oliveira, infelizmente, ainda não ter morrido já é um fantasma no cinema português. Boa banda sonora e boa embalagem! - Marcos, o stór