The Abolition of Work - part 1
Bruno Borges
(Buraco / Oficina Arara; 2013)
Eis um livro impresso em serigrafia que adapta para BD o texto A abolição do trabalho de Bob Black - muito bem editado em Portugal pela extinta Crise Luxuosa no ano de 1998 - que é um ensaio anarquista bastante sóbrio sobre porque o trabalho deve ser abolido, sendo que a razão mais simples e importante é que o trabalho mata-nos, pura e simplesmente!
Robert Anton Wilson (também editado cá em Portugal) já nos avisou que não nos devemos preocupar com o desemprego, que este aliás é inevitável com a robotização do trabalho, e que deviamos aproveitar o tempo em mãos para fazermos coisas mais interessantes. Talvez seja por isso que fico feliz em ver os "boys" do meu bairro, um "white trash" tuga que só falam de futebol, sentados todo dia e a beber desde as 11 da manhã, porque vejo neles a vanguarda social deste futuro magnífico que nos espera em que deixaremos de trabalhar de forma coerciva. Claro que me enerva um bocado saber que eles passam o dia a mamar cerveja enquanto eu bulo das 9 às 5 mas o mundo é assim mesmo, há pessoas que estão sempre um bocado mais à frente e isso não quer dizer que tenham de ser sempre os burguesitos convencidos pseudo-intelectualóides como eu a estar na linha da frente... Hélas!
Junto a esta ligeira incompreensão do mundo com mais uma outra, que é esta edição, que apesar de porreira, é um pequeno objecto de luxo. Umas quantas páginas impressas a duas cores que custam uns 15 euros... baseadas num texto de teor libertário. E em inglês que é para todos perceberem!
Já sabia que um dia no futuro haveriam de colocar um anarquista em formol num museu de antropologia mas parece que antes disso, os textos anarquistas irão-se transformar em livros de artistas para as elites puderem admirar as suas colecções de obras subversivas. Lembra a escandaleira desta "silly season" em que uma tiazeca qualquer disse era giro tirar "férias a brincar aos pobrezitos". Que paranoia a minha! Realmente acordar de manhã para ir para o escritório faz mal à cabeça!
Graficamente este livro prova que Borges é um dos artistas gráficos portugueses mais fabulosos, o seu traço é tão apurado que tanto resulta em formatos pequenos (como o A6 do Mesinha de Cabeceira #23) como em formatos grandes (como este livro maior que A4) ou ainda realmente em grandes formatos como cartazes ou murais. O uso de serigrafia para fazer manchas amarelas resulta muito bem no trabalho "minimalista" de Borges. A vontade de adaptar o texto de Black na totalidade parece um exercício desnecessário - e até mau - que acaba por resultar em algumas páginas inundadas de texto que por acaso até se lêm bem porque o texto de Black é inteligente e a letra de Borges é arrejada e bonita.
O Buraco, colectivo editorial que pretendia fazer publicações politizadas têm se transformado em mais uns "artsy-fartsys" como milhares de outros pelo mundo fora. Se no inicio o formato de jornal a preço simbólico fazia todo o sentido, as suas últimas edições (incluindo esta) mostram que afinal o que querem é edições artísticas que não serão acessíveis aos... desempregados. Podem afirmar que a serigrafia é cara porque ultimamente tem estado associada a cartazes de edições limitadas (Mike Goes West) ou livros de artistas (Oficina do Cego) mas neste caso até parece-me falacioso a julgar pelo objecto em si, de poucas páginas e sem agrafos... Na cena Punk a serigrafia é considerada uma forma de impressão DIY barata, perfeita para militância e propaganda, mas prontossss... give the anarchist a cigarette!
(Buraco / Oficina Arara; 2013)
Eis um livro impresso em serigrafia que adapta para BD o texto A abolição do trabalho de Bob Black - muito bem editado em Portugal pela extinta Crise Luxuosa no ano de 1998 - que é um ensaio anarquista bastante sóbrio sobre porque o trabalho deve ser abolido, sendo que a razão mais simples e importante é que o trabalho mata-nos, pura e simplesmente!
Robert Anton Wilson (também editado cá em Portugal) já nos avisou que não nos devemos preocupar com o desemprego, que este aliás é inevitável com a robotização do trabalho, e que deviamos aproveitar o tempo em mãos para fazermos coisas mais interessantes. Talvez seja por isso que fico feliz em ver os "boys" do meu bairro, um "white trash" tuga que só falam de futebol, sentados todo dia e a beber desde as 11 da manhã, porque vejo neles a vanguarda social deste futuro magnífico que nos espera em que deixaremos de trabalhar de forma coerciva. Claro que me enerva um bocado saber que eles passam o dia a mamar cerveja enquanto eu bulo das 9 às 5 mas o mundo é assim mesmo, há pessoas que estão sempre um bocado mais à frente e isso não quer dizer que tenham de ser sempre os burguesitos convencidos pseudo-intelectualóides como eu a estar na linha da frente... Hélas!
Junto a esta ligeira incompreensão do mundo com mais uma outra, que é esta edição, que apesar de porreira, é um pequeno objecto de luxo. Umas quantas páginas impressas a duas cores que custam uns 15 euros... baseadas num texto de teor libertário. E em inglês que é para todos perceberem!
Já sabia que um dia no futuro haveriam de colocar um anarquista em formol num museu de antropologia mas parece que antes disso, os textos anarquistas irão-se transformar em livros de artistas para as elites puderem admirar as suas colecções de obras subversivas. Lembra a escandaleira desta "silly season" em que uma tiazeca qualquer disse era giro tirar "férias a brincar aos pobrezitos". Que paranoia a minha! Realmente acordar de manhã para ir para o escritório faz mal à cabeça!
Graficamente este livro prova que Borges é um dos artistas gráficos portugueses mais fabulosos, o seu traço é tão apurado que tanto resulta em formatos pequenos (como o A6 do Mesinha de Cabeceira #23) como em formatos grandes (como este livro maior que A4) ou ainda realmente em grandes formatos como cartazes ou murais. O uso de serigrafia para fazer manchas amarelas resulta muito bem no trabalho "minimalista" de Borges. A vontade de adaptar o texto de Black na totalidade parece um exercício desnecessário - e até mau - que acaba por resultar em algumas páginas inundadas de texto que por acaso até se lêm bem porque o texto de Black é inteligente e a letra de Borges é arrejada e bonita.
O Buraco, colectivo editorial que pretendia fazer publicações politizadas têm se transformado em mais uns "artsy-fartsys" como milhares de outros pelo mundo fora. Se no inicio o formato de jornal a preço simbólico fazia todo o sentido, as suas últimas edições (incluindo esta) mostram que afinal o que querem é edições artísticas que não serão acessíveis aos... desempregados. Podem afirmar que a serigrafia é cara porque ultimamente tem estado associada a cartazes de edições limitadas (Mike Goes West) ou livros de artistas (Oficina do Cego) mas neste caso até parece-me falacioso a julgar pelo objecto em si, de poucas páginas e sem agrafos... Na cena Punk a serigrafia é considerada uma forma de impressão DIY barata, perfeita para militância e propaganda, mas prontossss... give the anarchist a cigarette!
8 comentários:
Não é honesto dizer-se que os desempregados gostariam de comprar as edições do Buraco mas que, infelizmente, não podem. Não me apercebi de mais desempregados a levar as publicações ao preço da uva mijona do que as outras, tidas por esses lados como de artista.
Há uma implicação moral no que dizes que não faz sentido nenhum: o próprio Black, que eu saiba, não vive do ar, apesar de muito provavelmente viver muito mais feliz com a forma como *não* trabalha. Alguns de nós, como sabes, dependem diariamente do trabalho artístico que escolhem desenvolver. E pensam e pesam as coisas e esse peso não tem como objectivo a gula nem a ostentação de auras. O teu texto não é honesto porque não podemos comparar valores utilizando os critérios do preço chinês, seja a China onde for - isso de virem comadrezinhas meterem-nos na mesma paróquia que elas só para poderem acertar com os seus perdigotos, é novelesco. E algo triste. O texto do Black está integralmente disponível na net. É uma informação que de bom grado passamos. Quem não achar digno, não puder, não gostar ou não quiser dar o que é pedido pelo trabalho do Borges (que nem sempre é dinheiro, como preferes talvez nem saber), simplesmente não compra e pode ir ao amigo empregado mais próximo descarregar o texto da net. Não é honesto porque, pelos vistos, mesmo nesse teu meio punk ou anarquista ou lá o que contra-for, continua a dar-se mais valor (de troca) ao que é feito para exibir nas paredes do que ao que catalogas como um objecto de poucas páginas e sem agrafos e que, fiquei a saber, está pré-estabelecido não poder atingir certos valores, ainda que tecnicamente seja como um (ou vários) cartazes. Não é honesto porque te dás ao prazer de dar como provada a ética de um colectivo sem te teres incomodado em saber em primeira mão (e isso foi e é sempre possível) o porquê de certas opções. Não é honesto porque utilizas uma abordagem cínica – que por vezes se deixa confundir propositadamente com “cosmopolitismo” ou “cena-punk-fora”, em vez de chamar à discussão um assunto que até seria discutível. Para moralismos destes só mesmo os beatos, de que religião forem.
questionar a minha honestidade, cinismo, moralismo, prazer e beatice também tem muito que se lhe diga para quem mete no mesmo saco o mercado chinês e a cultura DIY. Que eu saiba é possível fazer equílibrio entre arte, mercado e produtos. para mim não me parece que este livro seja equilibrado nesse sentido como aliás quase todas as produções feitas nos últimos tempos dos chamados "livros de artista" mas isso é outra conversa que ainda virá um dia à baila neste blogue...
Este objecto fala por ele próprio... não preciso de perguntar ao Bruno Borges ou outras pessoas sobre as suas opções editoriais. Elas estão à vista, se a Usurpária não vê nada de paradoxal em usar textos anarquistas destes para fazer livros elitistas, o problema não é meu...
Give the Usurpária a cigarette!
... mas porque é que que dizes que este é um livro elitista? porque achas caro? porque é serigrafia? porque está em inglês?
o abolition editado pela arara / buraco foi pensado para existir como saiu (naquele papel, sem agrafo, as 24 páginas a 2 cores, com o texto na versão original adaptado para BD, em cadernos e em serigrafia), depois de muito se ter questionado o investimento e o preço a que o livro estaria disponível ao público. a opção de o editar em serigrafia é tão simples como acharmos que temos meios para isso e querermos fazer livros do início ao fim. e se custa às pessoas darem 15 euros por ele, também nos custou, e muito, botar o livro cá fora. assim como custa manter projectos como estes, a pensar e a produzir edição por nós próprios.
poderia existir num outro formato mas também seria uma outra coisa; e não está descartada a sua tradução para outras línguas. aqui procurou-se, justamente, um equilíbrio entre todas estas coisas para uma primeira edição e sempre com a ideia de criar comunidade. não houve aqui qualquer especulação da nossa parte; e a exclusão de que falas, no meu ver, terá a ver com outros factores como as pessoas terem pouco dinheiro ou optarem por gastá-lo de outra maneira que não seja a comprar livros, ver concertos, ir ao teatro, etc.
e ainda em relação à propaganda, parece-me que nunca foi o objectivo de projectos editoriais como o buraco ou a arara; existe um compromisso político que não passa necessariamente por aí.
Bruno Borges
oi Bruno,
sim acho caro para o objecto que é...
admito que algum repúdio que tenho à coisa é porque ela acompanha sem querer todo esse embuste que vivemos nos dias de hoje que são os livros "limitados" e/ou "de artista": a maior parte uma grande bodega de conteúdo (não é o teu caso! gosto imenso do teu trabalho, e este em particular apesar de alguns defeitos minimos acho-o bom também!), muitos deles horríveis em aspecto final (este quase vai lá parar), caros, especuladores, etc...
inevitávelmente o teu livro apanha com este contexto e sendo um texto anarquista ainda por cima, dá mesmo vontade de gozar com ele e as suas opções. acho que se tivesse sido feito há 10 anos atrás não teria a mesma opinião.
zeitgeist sucks! (os filmes e o tal espírito do tempo!)
abraços
M
marcos,
ok, compreendo. mais ou menos...
é o problema das categorias. não sei se isto é um livro de artista ou lá o que isso é; parece-me um conceito demasiado estúpido. e, sinceramente, acho que isso não interessa para nada. é um livro. do qual falaste muito pouco. tentaste encaixá-lo aqui ou ali, batendo de um lado e do outro... (?)
tem as suas fragilidades e eu reconheço-as; nunca tinha pensado uma BD com tantas páginas e isso trouxe-me problemas novos, partes que não fiquei satisfeito, etc. mas, em relação à edição, estou bastante contente. talvez também por estar consciente do esforço e dificuldade em parir uma coisa destas; mas também do gozo que dá.e esta é só a primeira parte de 4 fascículos.
em relação ao texto anarquista... é uma outra discussão que nem sei se interessa ou me apetece ter aqui; o próprio black bate nalguns deles. sei que o texto tocou e inspirou toda a gente que ajudou a fazer o livro.
abraços,
bruno
é um texto maravilhoso, li na na altura e sem querer reli até por tua culpa e com muito prazer, quando publicaste uma parte numa antologia qualquer... agradeço-te teres recuperado este texto!
gosto da tua BD, apesar de defeitos minimos... mas a edição é o que menos gosto... paciência!
abraços
M
15€ custam umas havaianas. 15€ custa um boné com um "a" maiúsculo com um círculo à volta feito na China. 15€ custa uma sapateira recheada. 15€ é o que as nossas elites de desempregados gastam por semana em chamadas e mensagens de telemóvel. 15€ é quanto custa um whisky corrente ou 15 cervejas, que é o tempo médio de leitura desta publicação...
15€ por cada "Abolition" são umas migalhas, que não cobre nem metade do investimento humano e material gasto na produção desta publicação. Mas encheu-nos a alma, e mantém-nos vivos, à tona, mesmo que no limiar, sem emprego e sem patrão, sem escritório nem horários de entrada ou saída. 15€ será sempre muito para quem considera os livros uma excepção e para quem não olha para a expressão DIY, ou o Faça-Você-Mesmo no sentido mais extremista desta máxima, quero dizer, do princípio ao fim, com todas as letras e com todas as unhas!
Quanto ao resto, confundiste propositadamente "artisticidade" com "plasticidade". Se do primeiro temos o mesmo repúdio de estimação que tanto prezas, do segundo fazemos porta-estandarte. Porque acreditamos que um pouco de perfume sempre fica nas mãos de quem oferece flores. Porque de fanzines anarco-punks a 1€, daqueles que ninguém leu ou irá ler, mas que reivindicam a política e estética que tanto apregoas, está a livraria Utopia cheia... Utopia! Esse palavrão... Enquanto existirem paróquias tão próximas a discutir mesquinhices deste calibre será sempre uma miragem fotocopiada a preto e branca, cheia de agrafos.
hahahahahahaha
anarchy-chic... très très jolie!!!
continuem o vosso excelente trabalho que vos enche a Alma, nada mais anarquico que trabalhar sobre algo que não cobre os custos mas que cobre a vossa Alma.
realmente 15 euros e agrafos (made in china) são coisas mesquinhas. para abolir-vos de mais trabalho nos comentários deste blogue, afirmo que afinal estou arrependido The Abolition of Work - Volume 1 da Arara/buraco/borges vale 15 euros ou até mais!
You love the smell of perfume in the mourning!
M
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