quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Pós-turismo?


Dantes as bandas reivindicativas chamavam-se Millions of Dead Cops (MdC acrónimo que batia com o do meu zine, hehehe) agora é mais Millions of Dead Tourists. Se há alas de anarquistas pacifistas que dizem que os porcos vestidos de azul são apenas proletário enganado pelo sistema e que merece uma chance de ser reconvertido às causas justas e revolucionárias, o que dizer dos turistas? Esses grandes cabrões que somos todos nós - ou que fomos ou que seremos: Actualmente, Paris (...) suporta hordas de visitantes estrangeiros, e tem de alojar e alimentar cerca de 100.000 deles todas as noites, nos meses de verão. (...) Estes invasores, que vêm comandar as economias e definir as culturas dos lugares que visitam, superam exércitos históricos de renome em tamanho e força. Rommel, a "Raposa do Deserto" (...) lutou contra os Aliados na Cirenaica com menos de 80.000 "Afrika Corps". A Grande Armée de Napoleão (..) em Waterloo, contou com 72.000 almas. (...) Todos estes exércitos parecem pitorescos, quando contrastados com as hordas de mochilas que invadem a Torre Eiffel, todas as tardes de Junho. As citações são do texto "A Grande Volta - O exército Neoliberal Paga o Seu Próprio Passeio" de Ian F. Svenonius in Contra a Palavra Escrita, editado pela Chili Com Carne.

Svenonius já tinha feito um ensaio como o Electro-Clash e o Neo-Folk em que afirmava que estes géneros musicais eram o fruto das crises da habitação. Afinal de contas as "bandas de garagem" precisam de um espaço para ensaiar, sendo o Rock um objecto de interesse imobiliário e os seus subgéneros modelam-se conforme o mercado. As bandas Electro e Folk lá se desenrascam no apartamento sem fazer muito barulho com os seus sintetizadors, drum-machines, guitarras acústicas, ou seja, sem a barulheira e transtorno de uma bateria real como as do Rock, daí terem emergido durante as crises imobiliárias deste milénio. Os MoDT são gregos e tratam neste segundo álbum, Helicoide (1000+1 Tilt; 2018) várias questões contemporâneas que passam, por exemplo, pelo turismo e a degradação urbana da sua exploração - hostels, air b'n'b, hoteis, brunches - nas cidades em que habitam. O tema-título fez-me ir recuperar imediatamente o tema "Helicoid" dos suecos Omala (na colectânea Art of Life da Fast Forward, 1993) mas não há comparação. Os suecos são uns amores exóticos ambientais, enquanto os gregos praticam um Dark Ambient frio e sem vontade de simpatia, realçando a diferença entre os dias de hoje e os 80/90. Antes tinhamos medo de um mundo nojento, hoje temos apenas nojo deste mundo cheio de medo. 

O segundo tema, "Nothing is possible", conclui o que os Crass publicitaram em 1984, quando acabaram, que os nossos desejos são apenas produtos e falsos da máquina capitalista. O panóptico do controlo via redes sociais é tratado em "Social media as a concentration camp" e o tema final, "The long and suffiently agonizing death of a Chicago boy",  é um manifesto contra o nosso mundo todo ele "gamificado" e monetarizado. Fazendo de algoritmo humano (se gostaste disto então vais gostar disto): iguais preocupações podem ser detectados nos discos de Metadevice. Só que ao contrário de Metadevice, a música dos MdDT é agradável de se ouvir apesar de Cold, não tem peso Industrial nem pica-miolos Noise, é até meio Kosmische - ups! receio estar a provocar esta malta porque devem estar fartos de "boches" bêbados turistas! Tal como em Sci Fi Industries há ritmo e pulsar electrónico, máquinas sob batuta humana e vontade escapar a este (i)mundo...

Gracias Pastor Gaiteiro pela rodela!

sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Em banda desenhada?


136 páginas de BDs curtas de Francisco Sousa Lobo, criadas desde 2004 até este ano.
Algumas são inéditas outras já publicadas, muitas em publicações estrangeiras, que assim são publicadas em português pela primeira vez. Algumas BDs são a preto e branco, outras tem mais uma cor e algumas são a cores. O formato é aquele típico do nosso catálogo: 16,5x23cm

Disponível na nossa loja em linha, BdMania, Tigre de Papel, Linha de Sombra, Mundo Fantasma, Nouvelle Librarie Française, Tasca Mastai, Snob, Matéria PrimaKingpin BooksUtopiaSTET, A Vida Portuguesa e Fábrica Features. E na Libraria Paz (Pontevedra)



A Sara Figueiredo Costa assina um prefácio que aqui transcrevemos parte:

Diz-nos a física quântica que o tempo não existe, pelo menos do modo cronológico, arrumado e em sucessão, o modo como o conseguimos ver e sentir. E diz-nos que tempo e espaço se relacionam de tal modo que serão, juntos, uma categoria única de descrição do que nos rodeia, uma ferramenta funcional para obtermos respostas tão precisas quanto o universo permite sobre si próprio. A física quântica não é fácil de perceber para a maioria da humanidade e é frequente que outras linguagens nos deixem intuir respostas que, não sendo mais claras, são mais facilmente apreendidas pela intuição. As histórias curtas de Francisco Sousa Lobo não falam de física quântica, cultivando as perguntas com muito mais dedicação do que qualquer resposta, mas talvez por isso mesmo sejam uma espécie de mapa possível para certas declinações do mundo, não as que descrevem o cosmos, mas as que envolvem o indivíduo, esse lugar estranho e inóspito onde o espaço-tempo tantas vezes ameaça desintegrar-se. 

(...) O desconforto que muitas das histórias reunidas neste volume criam no leitor não nasce tanto do desamparo encenado em cada prancha, ou da possibilidade de alguns ou muitos reconhecimentos emocionais, mas talvez do contraste provocado pela procura de uma racionalidade, um gesto narrativo e visual que transforme a matéria das histórias nas histórias em si. É esse o esforço que se descobre em cada história, e é esse o percurso que estrutura esta primeira narrativa do livro, de certo modo, uma antecipação certeira das que se lhe seguem. (...) Não é preciso mergulhar na física quântica quando temos à mão a nossa própria cabeça, o nosso próprio corpo e o lastro imenso de memórias e vivências que confirmam, a cada momento, que estamos sempre em presença efectiva de muitos momentos e que aquilo a que chamamos passado talvez seja, por inconveniente que soe, o nosso presente constante.

 E como bem descreve o Bandas Desenhadas: Pequenos Problemas é o livro mais recente de Francisco Sousa Lobo. Editado na série Mercantologia da Chili Com Carne, dedicada à reedição de “material perdido”, compila 15 bandas desenhadas curtas do autor, produzidas entre 2005 e 2018. Existindo algumas BD inéditas, as restantes foram editadas em publicações portuguesas ou estrangeiras, nomeadamente a Nyx, a Nocturnal, š! #20: Desassossego, Art Review, Mesinha de Cabeceira, Crumbs, Quadradinhos: Sguardi sul Fumetto Portoghese, Performance Research, Zona de Desconforto, Preto no Branco #4, Próximo Futuro e Jornal Universitário. As BD estrangeiras apresentam-se pela primeira vez em língua portuguesa.


FEEDBACK: 

Muito bom, o pequenos problemas do FSL. Parabéns ao autor e à Chili Com Carne. 
E.O.M. (por e-mail)

(...) «O problema Francisco era um problema de culpa.» Ora, a culpa inventa retroactivamente o pecado. Por isso, o retorno continuado para esse «país chamado infância» que surge em tantas destas bandas desenhadas, em que se busca aquietação, se procura respostas ou se tenta compreender o que se passou de errado. Voltar ao sítio do crime original para encontrar provas. «Voltei à infância e descobri falsos traumas». Que até poderiam ser tranquilizadores, se os conseguíssemos contrabandear como causas, explicações, desculpas. Nunca saramos da infância, temos aqui a prova nesta «intacta ferida» latejante. Só que as dores que permanecem não são produto de um acidente, um azar ou um desvio; são apenas a própria vida que acontece e a infância que passa, o desapontamento, a desilusão e o desespero que equivalem a crescermos em anos. Tantas destas bandas desenhadas remetem para esse passado, unicamente para atestarem que este exercício da autobiografia, mais do que um ato masoquista, toma os contornos de uma aldrabice, um fingimento. «A banda desenhada era uma doença». Por um «interesse doentio pelo desenho», se revela então uma inclinação para o «lado do mal» ou, por extenso, para «a literatura, a arte, e tudo o que há de mais nocivo e infértil nesta terra de deus desconhecido». Valha-nos, porém, que a banda desenhada pode ser paradoxalmente a terapia com que se recupera o poiso para a razão, ou que se usa para (auto-)representa rum «eu» liquefeito pela psicose ou que soçobra diante da enormidade da tarefa de viver.
é que é um verdadeiro livro de auto-ajuda, no sentido em que me poupa andar é procura de todas. As histórias foram produzidas entre 2004 e 2018, reunindo mais de 10 anos de trabalho. É muito interessante encontrar aqui muitas reflexões que surgiriam mais tarde no futuro e em obras mais longas de Sousa Lobo, onde ele continuou a explorar os temas de família, religião e importância da arte, além da descrição de certos episódios relacionados o colapso psicótico do autor, que desencadeou o famoso Desenhador Defunto. É realmente um privilégio a maneira como Sousa Lobo é tão aberto e honesto sobre esse momento difícil, tendo sempre algo novo a acrescentar, uma camada extra para compartilhar connosco.

terça-feira, 20 de agosto de 2024

Recuerdos de Viñetas

Farrajota explicando que as editoras portuguesas são betinhas usando a icónica t-shirt do Rei da BD portuguesa...
 
Onde estão os dois Chilis?
 

E até houve TV connosco!

Obrigado ao Craneo, Rómulo, Marta, Manel & ACAB! 

domingo, 4 de agosto de 2024

ccc@viñetas.desde.o.atlántico


Foi o Duarte da Snob que inventou esta: "férias" e "feiras" dá em "Féirias". Ou seja quando um gajo vai de féria mas ainda faz uma feira do livro. Pena que em castelhano não dê pra fazer a mesma brincadeira  porque os gajos dizem "vacaciones".

Isto para dizer que a Chili Com Carne vai à edição deste ano do festival Viñetas Desde o Atlántico n'A Corunha, Galiza. Haverá uma exposição no ACAB, presença com stand na Rua da BDum "faladoiro" sobre a Betalhada que é o mercado de BD em Portugal (dia 14, às 19h) e ainda banhocas no Atlântico porque este povo é esperto e faz "siesta"!

Hasta!

Ensaio para 30 : Colectiva Chili Com Carne #7


1, 2, 1, 2, som, som, som

É curioso que sempre que a Chili Com Carne faz um número redondo, comemora em Espanha - em 2015 ao fazermos 20 anos formos parar à Biblioteca Pública Casa das Conchas, em Salamanca, no âmbito do Encuentro de Editores Inclasificables - e neste quase quase quase 30 anos eis-nos a ensaiar uma comemoração dessas três décadas de existência no festival de BD Viñetas Desde o Atlântico n'A Corunha, Galiza.

A Chili Com Carne é uma organização de jovens artistas sem fins lucrativos cujo funcionamento assenta na cooperação livre e espontânea dos seus associados. Desde a sua fundação em 1995 que temos promovido e desenvolvido as mais diversas realizações no campo das artes, que se têm concretizado, entre outros aspectos, na organização de diversas exposições e publicações. Temos entendido como sendo prioritária uma linha de actuação que privilegie a independência do autor, entendida como liberdade e autonomia de critérios do produtor de objectos artísticos, acentuando a diversidade de formas e conteúdos que caracterizam a expressão artística e cultural contemporânea. 

Desde 2000 que trabalhamos sobretudo na área da edição em que todas as infecções são possíveis nos livros ou discos publicados: literatura, Banda Desenhada, ilustração, ensaio e música. Livros que são discos ou vice-versa. BDs que desafiam as fronteiras da ilustração ou da literatura, onde começam e acabam cada uma delas? Os livros que são zines ou será antes o contrário? A cultura digital trouxe-nos mais incertezas do que nunca, na Chili vivemos com elas e lançamos mais achas prás fogueiras dos mercados livreiros e não só. 

Trinta anos resulta em acções mil, participações de outras centenas de artistas e dezenas de parcerias. Entre 12 e 18 de Agosto na Agrupacion Cultural Alexandre Boveda será apresentado uma miscelânea de materiais que encontramos na sede da Chili: cartazes, serigrafias, impressões digitais, ilustrações, desenhos, pranchas de BD e colagens.

Participam neste maelström gráfico, trabalhos de 40 Ladrões, Rodolfo Mariano, Jucifer, Marcos Farrajota, Nunsky, Luís Barreto, Júlia Barata, Dois vês, Isabel Lobinho (1947-2021), Fábio Zimbres (bra), Elias Taño (esp), Bruno Borges, Joana Pires, Rafael Gouveia, Ana Margarida Matos, Afonso Ferreira, Hetamoé, Harukichi (jap), André Pereira, Ilan Manouach (gre), André Ferreira, José Feitor, Daniel Lopes, Tiago da Bernarda, André Lemos, João Carola, José Smith Vargas, Ricardo Paião Oliveira, André Coelho, Angel Mosquito (arg), Tiago Baptista, Francisco Sousa Lobo, Alexandra Saldanha, Mattias Elftorp com Sofia Lindh (sue), Rui Moura (imagem), Nevada Hill (1982-2016; eua), Amanda Baeza, Mariana Pita, Ivo Puiupo, Gonçalo Duarte, Mao, Daniel Lima e Matilde Basto.

A exposição será DIY + lowcost mas sem querermos enganar o público: originais e múltiplos nobres (serigrafias, offset) serão emoldurados. Os prints digitais não. algumas peças apenas sobreviveram a tournês pela Europa, outras foram impressas de propósito mas será dada dignidade a todos os participantes que foram e ainda são importantes na História da Chili - e sim pró ano a CCC faz 30!

1, 2, 1, 2, som, som, som

sábado, 3 de agosto de 2024

Amigo, adivinha o que anda por aí nas boas livrarias e discotecas?


O Gato Mariano : Críticas Felinas (2014-2018) 
 de 





 A música portuguesa sob o escárnio de um gato desbocado.

Peludo, porte médio, língua afiada. É assim que Tiago da Bernarda descreve o seu alter-ego, mais conhecido como Gato Mariano, o crítico felino que vagueia os confins da Internet. É nesse lugar amorfo e amoral que, desde 2014, tem vindo a discutir sobre os mais recentes projectos da música alternativa portuguesa.

 O que começou como webcomic vira agora uma antologia que reúne as melhores tiras dos últimos quatro anos, num intenso volume de  144 páginas, muitas delas a cores (18x25cm) e uma super-capa com cortante de gato assanhado!

 O Gato Mariano é uma das grandes criações da década (estimativa conservadora) em Portugal. Possivelmente nunca lhe será feita devida justiça, até porque um dos encantos que tem é a "subterraneidade", o traço e as reflexões como nos grandes mestres de apelo clandestino na BD do final do século passado. Não é um Kochalka português, nem um Tony Millionaire português, nem um Mike Diana português; é um Tiago da Bernarda português. 
Samuel Úria

...

Volume 13 da Colecção Mercantologia, dedicada à recuperação de material perdido no mundo dos fanzines e afins. Editado por Marcos Farrajota, design de Joana Pires e publicado pela Associação Chili Com Carne, o presente volume apresenta uma selecção de várias BDs da série O Gato Mariano publicado originalmente em várias plataformas em linha, desde 2014, com o nome Críticas Felinas (actualmente em instagram.com/ogatomariano_), no sítio Rimas e Batidas, nos zines O Gato Mariano Não Fez Listas em 2015O Gato Mariano não fez listas e confrontou um fã que disse não perceber as suas reviews em 2016 e O Gato Mariano não fez listas em 2017 e nos dois números do fanzine Mariano (2016-17).

Esta edição teve o apoio do IPDJ, Lovers & Lollypops e Thisco.


pode ser adquirido na loja em linha da Chili Com Carne, Flur, BdMania, Tigre de Papel, Tasca Mastai, Linha de Sombra, Kingpin, Mundo Fantasma, RastilhoMatéria PrimaUtopia, A Vida Portuguesa, Snob e Universal Tongue.


FEEDBACK

Num livro cheio de Críticas Felinas, o Gato Mariano arranha, mas faz rir
P3

"O Gato Mariano", o felino que arranha a música nacional
Sapo 24

O Tiago da Bernarda rapidamente se desencantou com a crítica em geral e a musical em particular. Criou uma linguagem e um espaço próprios para fazer e simultaneamente não fazer nem crítica de música nem tiras cómicas. (...) Não faz listas, não faz críticas, não faz tiras… E produz tanto? Aqui há gato!
Bandas Desenhadas

Este gato arranha bem (e a crítica musical já não é o que era)
Ípsilon / Público



HISTORIAL:  

Lançado no dia 19 de Janeiro de 2019 na Casa Independente com Hip Hop nulo 

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Escolha do Vendedor FNAC do Chiado talvez por ser o dia mundial do gato! Obrigado Sandra:





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auto-elogio na Bedeteca do Porto

Sabe-se lá porquê mas há uma década, Tiago da Bernarda, um estagiário jornalismo (e sem formação em desenho) fartou-se de ser explorado pelo sistema falido da imprensa social e começou a fazer tiras de crítica a discos de música portuguesa, criando um alter-ego felino, o Gato Mariano, e publicando em plataformas digitais ou em fanzines auto-editados. A Chili Com Carne juntou toda essa produção num “luxuoso” livro que se tornou num compêndio para quem gosta de música. Do Punk ao Hip Hop, dos GNR aos 10 000 Russos, os discos são arranhados ou acariciados pelo Gato. Depois do livro ter saído, o bichano começou a miar para outras bandas mais “fashion”, políticas e sociais, para além de ter arranjado um sobrinho pós-irónico, o Bruninho, para expor as contradições geracionais. Alguém se digne a comemorar os 10 anos de existência deste gato desbocado!




Tiago da Bernarda [n. 1990] Ilustrador freelancer, autor da webcomic “O Gato Mariano”. Licenciou-se em Ciências da Comunicação na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e, posteriormente, tirou o curso de Ilustração para Novos Media na ETIC. Colaborou com festivais como Milhões de Festa, Zigurfest ou Black Bass – Évora Fest. Ocasionalmente com o site Rimas e Batidas.