Anti-propaganda
No outro dia fiz um exercício de compilar na BD portuguesa quantos trabalhos haveriam com o "tema da homossexualidade" - faço as aspas para indicar que o tema significa desde personagens assumidamente homossexuais até BD cuja a "acção" ou "texto" tenham algo haver com homosseexualidade. Acho que bastou uma mão para contar esses trabalhos estando nessa lista desde um "cameo" de António Variações no primeiro álbum do Pitanga (é uma grande estica!) às infantilidades dos Jogos Humanos. Safaram-se Pedro Brito e David Soares, escritores de BD espertos, que em alguns dos seus livros incluiram personagens sólidas nas suas histórias!
Propaganda (Plana Press; 2014) é a primeira obra que trata exclusivamente sobre "este tema", por acaso sobre uma pespectiva fora do normal porque a autora Joana Estrela ofereceu-se como voluntária na Lituánia para trabalhar numa organização Gay e Lésbica, trabalho bem complicado diga-se quando este país é reconhecido por ser o mais homofóbico da Europa. A BD não chega a ser muito profunda na relação entre personagens - a sexualidade é ausente no livro - limitando-se a ser um diário de situações sociais entre os voluntários, em que Estrela usa um desenho simples, suave e funcional para esse efeito. O que é mais interessante é a forma como esta BD denuncia como aparecem no quotidiano de forma irracional e stressante as questões da homossexualidade (mal-)tratadas nos mass-media - desde jornalistas feitos com o sistema a programas de festivais de Metal, I shit you not! - passando por manifestações públicas ou cartazes na rua. O título do livro não poderia estar mais bem escolhido!
Este é o primeiro livro completo de BD que sai pela Plana Press (o do Marco Mendes e da Christina Casnellie não contam realmente porque eram metade de ilustração ou de trabalhos fragmentados) e materializaram a iniciativa num impressionante grosso volume de cento e tal páginas agrafado de tal forma que até temos medo de mexer no livro - não por homofobia, claro, mas por receio que os agrafos não aguentem o folheamento do livro. Medos infundados porque a Plana sabe o que faz. Parabéns à autora e à editora.
Entretanto saiu o novo número d'O Fígado da República por José Smith Vargas - o primeiro número foi lançado em 2010 como é testemunhado aqui! Pelos vistos Smith aproveitou o Festival de Beja (onde recebeu o Prémio Geraldes Lino!?) para lançar algo novo e fez muito bem porque apesar da BD estar quase toda em linha nada melhor que pegar em papel - mesmo que no formato odiável do A4! - para ler uma BD destas como deve ser! Smith concentra-se na adaptação d'Os Operários de Raúl Brandão e escapa-se à parte ficcional que preparava sobre uma comunidade libertária algures no Alentejo. Dá pena perder essa parte ficcional mas o que sobra (cerca de 9 páginas) dá mais sumo que muito livro de BD de 150 páginas que anda por aí... Para quem está "fora" leia o link do "Festival de Beja" para perceber o que este Fígado e quem quiser ler o dito cujo procure no blogue do autor!
2 comentários:
Aqui no Brasil, na chamada cena independente, nem autoras mulheres tem quase, imagina tratar de homossexualidade (só se for para fazer chacota). Complicado.
países escrotos!
(literalmente)
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