segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Potencial em triplicado

Apesar da crise no sector da bd - em que a CCC e poucos mais resistem depois das euforias institucionais (1996/2002) e comerciais (2002-04) - creio que o pior era observar que na cena dos zines não apareciam autores para renovar o organismo. As euforias registadas tiveram base nessas publicações e enquanto houve muitos bons fanzines aguentaram-se nessa altura (Succedâneo, Na verdade tenho 60 anos, Gambuzine, Durty Cat, Zundap...). Entretanto desapareceram, alguns ficaram ar de pseudo-profissionalização (Mesinha de Cabeceira,...), os graphzines sobresairam (Imprensa Canalha, Opuntia Books),... A acrescentar ao rol de desgraças, a Bedeteca de Lisboa nunca mais lançou a colecção Lx Comics, e as dezenas de alunos inscritos em escolas de bd não sabem o que é auto-edição...
só recentemente é que tem aparecido indícios de uma nova geração de autores dispostos a usar as fotocópias baratas como forma de promoção do seu trabalho (como o Rudolfo) ou nestes três casos a apresentar como forma de desenvolverem um trabalho maior:

O Fígado da República (parte I)
José Smith Vargas
ed. de autor; Out'10

Smith há muito que tem colaborado em projectos da Chili Com Carne (Mutate & Survive, CriCa) mas sempre com ilustração / colagens. Só nos últimos anos é que o seu interesse pela bd se manifestou publicamente com uma "bd Apupópapa" e a participação no Destruição saído em Agosto - embora a sua estória tenha sido feita em 2008.
Este Fígado é o seu mais recente trabalho - em progresso - em que mostra uma vertente clássica e eficiente da narração, longe dos desiquílibrios de Passeio ao Norte de Portugal (bd publicada na referida antologia Destruição). Ao que parece, não tendo lido o texto, adapta excertos de forma bastante livre Os Operários de Raul Brandão nas suas (apenas) 10 páginas A4.
A acção passa-se em 1918, no meio do turbilhão republicano e os seus paradoxos frente à classe operária, e relata a estória de uma comuna que se instala no Alentejo... E basicamente teremos esperar por mais nos próximos zines que venham a ser produzidos pelo autor. Desde já avisa-se que estamos longe das inocuidades dolorosas das adaptações literárias Antigo regime (José Garcês e afins) e do espírito social "light" de Lacas (Obrigado, patrão!). A seguir atentamente!
este título pode ser adquirido na Casa da Achada


Bhikkhú
David Campos e Nuno Marques
Paracetamol; Out'10

Foi lançado durante na F.E.I.A. - David Campos foi um dos co-organizadores e responsável pelo cartaz - e vemos uma melhoria de ambas as partes em relação ao Meteoro Imprevisível. Da dupla, os textos de Marques são mais vivenciais e por isso mais interessantes de ler versus à poluição dos textos do Meteoro.
Da parte de David, aparece as primeiras páginas do seu "work-in-progress" diário de viagem a Guiné-Bissau. O registo gráfico lembra automáticamente algo de Baudoin pelo liberdade do uso de píncel e tinta-da-china mas o desenho é outro, mais realista. O texto está reduzido a nível de tamanho da letra / legendagem mas a curiosidade já é muita em relação ao futuro. E claro, 6 páginas sabem a muito pouco!


Cosmonauta
João Ortega
Mosca; Out'10

Entretanto em mundos da fantasia onde há as improváveis influências de Manga urbanas de Tekkonkinkreet, alguma fashion "emo-gothic" e admiração por Stockhausen.
Ortega apresenta três projectos apresentados a editoras de bd rejeitados, um drama que poderia ser insuportável se não tivesse posto no papel para uma crítica pública. Há várias falhas ou excessos - em desenho, paginação e enquadramentos - que Ortega irá perceber isso com esta experiência editorial.
Irá perceber com o feedback do público, da minha parte "voto" na bd Ruído Nómada (apesar da horrível "font" do texto) e gosto graficamente as últimas três páginas d'Os traslúcidos.
É uma opinião, que apareçam mais...

Estes dois últimos zines podem ser adquiridos aqui

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