domingo, 20 de dezembro de 2015

Fado Delicatessen



Imaginem uma geração que viu o Delicatessen (1991) e o O Fabuloso Destino de Amélie (2001)... E imaginem que essa malta deve achar que esses são os filmes das suas vidas porque apanharam um intervalo de 10 anos da vida deles. Assustador! Não é pior de quem viu apenas os "merdabusters" de Hollywood só que o problema é que esta malta faz música e outras criatividades por aí! E a malta acha giro o que fazem...

Isto é o que me passa pela cabeça quando recentemente ouvi de rajada o catálogo inteiro de discos da Turbina e concluo que não tenho paciência para música circense e sons giros. Sei que estou a ser injusto porque realmente muitos dos discos desta editora/ promotora são relativos a espectáculos para "todo o público" em que o factor "Delicatessen-Amélie" entra e faz todo sentido, goste-se ou não só que eu não gosto. Depois de ouvir esses discos "funcionais" (banda sonoras para espectáculos) levam por tabela os outros que não o são como NACO (Nunca Acordo Como Ontem), Peixe, Foge Foge Bandido e Nuno Prata.

Também ficam injustamente comparados a este mundo pós-FlorCaveira e pós-Dead Combo, ou seja, a um novo mercado nacional (re)aberto prá Pop cantada em português e música instrumental "bunita". Digo injusto porque muitos destes músicos foram dos Ornatos Violeta, banda que bem que lutou e com mestria contra um Portugal dos anos 90 que queria ser cosmopolita à força com o inglês das suas bandinhas Pop/Rock. Estes gajos são os genuínos, juntamente com malta do Hip Hop, porque mostraram que não era preciso prostituir-se em inglês (aló Blind Zero, aló Silence 4) para fazer Pop pró Top ou prá Glória. Os regressos são sempre injustos...

O que temos aqui é Folk "neo-neo-pós-pós" com montes de objectozinhos kiduxos para fazerem de percussão exótica como se se quisessem retornar emocionalmente a uma aula de música na infância - mas sem a perversão dos Ween. Ou regressar aos Violent Femmes da adolescência borbulhenta e suicida. Qualquer das intenções é fucking sick! quando falamos de homens adultos. No caso de Nuno Prata há um fantasma do Sérgio Godinho a assombrar-lhe as letras e tudo mais. Ser comparado ao Godinho é elogioso e tenho de admitir que Prata é bom no que faz nessa linha. Ou na outra, a dos Ornatos pois tantas vezes ao ouvir Prata sem atenção pode-se dizer que estamos a ouvir um disco perdido do seu ex-grupo. Só que ficamos por aqui, não há muito para inventar e o que se pode dizer sempre é que a música é gira... E giro é apenas isso... giro!

De referir que as edições da Turbina tem um bom design, quase bate a Matarroa (nããã... ninguém ainda bateu o nível do Chemega desses tempos!) ao ponto que na primeira impressão tudo parece muito giro (ops!) mas depois as ilustrações de NACO são do tipo "freak e esquece" ou o luxuoso livro dos dois CDs O Amor Dá-me Tesão / Não Fui Eu Que Estraguei (2008) do Foge Foge Bandido é totalmente inócuo - o que é lastimável quando o Manel Cruz é/era um desenhador cheio de pica (ou será piça?) como se testemunhava nas suas colaborações no zine Vómito e na revista Op. Outra embalagem gira (ai!) é o CD Todos os dias fossem estes / outros (2006) do Nuno Prata que se fixa num cartão grosso, o que permite rodar a rodela-disco e com isso mudar o título de Todos os dias fossem estes para Todos os dias fossem outros. Giro! (Não há fuga!)

Giro (isso... giro!) também é o Foge Foge Bandido, o tal duplo CD no tal livro pesadão que parece um diário gráfico de Cruz - eu escrevi "parece". As músicas são micro-narrativas (a maior parte com menos de 2 minutos) com gravações de campo (motas dos trolhas da minha terra, evangelistas brasileiros, risos de moca, etc...), esboços de canções a fazer com participações de cromos (Gon, Bezegol, Prata) ou não-músicos reunidas entre 1998 e 2007. Sim, é como se fosse um diário musical de Cruz... E como os diários costumam ser longamente solipsistas temos mais de duas horas de uma mini-saga espécie "Manu Chao de Matosinhos" ou "Jad Fair de Rio Tinto", em que os pedaços da vida são processados para uma obra áudio maior. É giro... E digo isto porque tendo bons momentos, a falta de filtro do material gravado torna a obra pesada - pesada por cansaço e não por profundidade, o que é uma pena porque o Cruz tem aquele genuíno estigma de "Génio Pop" como há poucos neste país.

PS - Ainda se encontra no catálogo Turbina os Hollow Nothing que é "electro-boring" e os Zelig que talvez venha a escrever sobre eles... será que merecem? Depois de passar semanas a ouvir coisas giras quase não me apetece ouvir mais música, Venha Venha Barulho!

PPS - Vá, senão nunca mais escrevo sobre eles... os Zeliq lembram Secret Chiefs 3 via Tradicionalists com Steroid Maximus com Tortoise com o filme italiano por Woddy Allen nunca feito. Joyce alive! (2010) tanto é "retro" e "post" de funcionário público a picar o ponto como chega a ter momentos de fúria de "grungeiro" frustrado mas nunca acha um equilíbrio para essa dicotomia. Funde bem Rock, Surf, Jazz, Exótica, Lounge, algo giro e sem alma. Talvez seja o melhor da Turbina mesmo sem alma... Altamente as ilustrações / design do Salão Coboi!

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